Grupos de Autocuidado em Hanseníase abrem encontro com sublimes lembranças e comemoram êxito de biojoias

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Grupos de Autocuidado em Hanseníase estão reunidos desde hoje (6) em Porto Velho no seu 4º Encontro Estadual, organizado pela Agência Estadual de Vigilância em Saúde (Agevisa). Até amanhã, seus integrantes trocarão experiências, serão motivados em seus projetos e se confraternizarão em jantar cultural.

Líderes dos grupos e fisioterapeutas da maioria dos 15 grupos se apresentaram, relatando situações. Em Vilhena, a 705 quilômetros de Porto Velho, por exemplo, o grupo está se reorganizando.

O coordenador de terapia ocupacional no Hospital Santa Marcelina, Cleomar Nascimento, lembrou-se com alegria de quando aprendeu a fabricar farinha de mandioca “junto com pacientes dos quais cuidava”.

 Segundo o Guia de Apoio para Grupos de Autocuidado em Hanseníase, a doença prevalece com índices elevados no País, porém, com tendência a estabilização dos coeficientes de detecção. As regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste concentram 53,5% dos casos detectados em apenas 17,5% da população brasileira.

“Eles cresceram, o estigma se foi, eu me sinto feliz por ver as pessoas de outras regiões brasileiras adquirindo e comprando produtos da Art’s BioHans”, disse Nascimento.

Integrantes dos grupos de diversas regiões do estado também ouviram palavras de gratidão da coordenadora estadual do Programa de Hanseníase da Agevisa, Albanete Mendonça.  Para serem vistos e cumprimentados, ela os chamou à frente da mesa, numa sala do Hotel Rondon Palace. Nesta quinta-feira (7), às 14h, eles irão ao Cine Veneza assistir o filme O extraordinário*.

A diretora do hospital, irmã Luiza Ambiel, falou de Jesus: “Ele agia diretamente com as pessoas, teve a missão de curar”. E explicou: “Na área da prevenção, podemos eliminar preconceitos, evitar sequelas e adotar cuidados; é o que Jesus fazia, chegando às pessoas antes das sequelas”.

Para a religiosa, as atuais estatísticas assustam, notadamente a respeito de doenças que voltam e são diagnosticadas tardiamente.

Desigualdades regionais e os determinantes sociais e culturais do processo saúde-doença têm contribuído ao longo dos anos com o desenho da hanseníase no País.

O avanço no combate é considerável, o tratamento, mais frequente e eficaz, a exemplo do Hospital Santa Marcelina.

Deve-se à Agevisa a constante abordagem, avaliação e monitoramento de serviços e indicadores em saúde. “Só a cura física não é suficiente, é preciso que estejam juntos o psico e o social, para o bem-estar das pessoas, quando elas se sentem e podem obter renda em grupos ou se reinserir no mercado de trabalho”, alertou a gerente técnica de vigilância epidemiológica, Maria Arlete Baldez.

Admirada com a evolução nesses aspectos, “fruto do carinho e da competência de todos”, a gerente incentivou-os: “Se orgulhem da arte que vocês têm dentro de si, porque a história do artesanato de Rondônia, hoje ultrapassa os quatro cantos do Brasil”.

“NUNCA DESISTI”

“Se colocarmos na mente que podemos, faremos; tudo o que realizarmos com amor no coração dá certo”, disse a diretora geral da Agevisa, Tânia Medeiros.

Maria Marluz de Carvalho, de Ouro Preto do Oeste, a 330 quilômetros de Porto Velho, trabalha desde 2015 no grupo de autocuidado de sua cidade, do qual é atualmente coordenadora. Tratou-se, mas ainda tem quedas súbitas, o que despertou a atenção dos demais servidores da escola onde trabalha.

A situação de Maria é exemplo de conscientização, já que a maioria da população desconhece a hanseníase, e até mesmo boa parte dos próprios pacientes em tratamento da doença.

“Não sabia que tinha a doença, caí diversas vezes, pediram para eu me aposentar, não quis, não desisti, não entreguei os pontos, continuo trabalhando”, contou Maria Marluz.

Depois de participar de uma oficina de gastronomia e iniciar a produção de biscoitos, Maria foi convidada para produzir biojoias. Está comprando as primeiras sementes.

Em Ariquemes, a 200 quilômetros da capital, ela encontrou representantes da organização não governamental NHR Brasil e aí se entusiasmou ainda mais. “Não pensava que pudesse conhecer Olinda e Recife, andar de avião; fui conhecer o mar!”.

Maria participou do 10º Simpósio Brasileiro de Hansenologia, no Recife, de 15 a 18 de outubro deste ano, junto com outros contemplados pela iniciativa estadual visando à inclusão social do paciente de hanseníase.

Lá foi montada uma exposição de biojoias produzidas pelo projeto da Art’s Hans de geração de renda.

 “ESCONDIDOS NO CANDEIAS”

A coordenadora regional do Programa de Hanseníase do Hospital Santa Marcelina, irmã Cláudia Grecce, disse que a retrospectiva de sua atuação lhe emociona: “Quando cheguei havia adultos e até crianças internados, compulsivos, eles tinham medo, mas apesar de sequelas e mutilações e sem funcionários para apoiá-los, eles se ajudavam e se sentiam amados, até esquecendo o abandono familiar”.

A religiosa veio para Porto Velho 34 anos atrás. “Agora, uma criança que tinha oito anos naquele período cresceu, se casou, e vem com a família nos visitar”, contou sorrindo.

Segundo a coordenadora, muitos hansenianos “viviam escondidos” na região do rio Candeias. “Foi gratificante assisti-los, quando ainda não havia médicos disponíveis; no meu caso, houve momentos em que chorei escondido, mesmo assim me doei e sinto que cada um deles me enriqueceu e o caminho realmente se abriu para todos os que cuidaram um do outro”.

Anteriormente ao hospital, os doentes eram atendidos na Colônia Jaime Abem Athar, fundada em 1954 no mesmo Km 17 da rodovia BR-364. Na realidade, o antigo Território Federal do Guaporé segregava portadores de hanseníase.

Em 1975, as Irmãs Marcelinas assumiram a administração e o desafio de um novo campo de trabalho.  “Os doentes passaram a ser tratados com dignidade e como filhos de Deus”, escreveram no site da instituição.

Assim, a ex-colônia ficou na história e o novo hospital foi construído no centro de uma pequena vila na floresta tropical amazônica. Suas instalações ocupam uma área de 300 hectares. Não demorou muito para se tornar referência estadual no tratamento da hanseníase, na confecção de orteses e próteses, saúde auditiva e visual. Tem atualmente 25 especialidades médicas e oferece atendimento a população do Estado de Rondônia, sul do Amazonas, e parte do Acre.

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* Dirigido por Stephen Chbosky, esse filme conta a história do menino Auggie Pullman, que nasceu com deformidade facial, submetendo-se a 27 cirurgias plásticas. Aos dez anos, ele frequenta pela primeira vez uma escola regular, e no quinto ano, se esforça para conseguir se encaixar em sua nova realidade.

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