O ambicioso plano de Bolsonaro de usar smartphones para criar um novo partido em 4 meses

O presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), apresentará a seus aliados políticos nesta terça-feira (11) o plano de criar uma nova legenda: a Aliança Pelo Brasil.

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A ideia é dispensar os cabos eleitorais nas ruas coletando assinaturas em papel. Os interessados em apoiar o novo partido do presidente da República usariam apenas um aplicativo de celular e o leitor de digitais de seus próprios aparelhos para firmar a adesão.

Com o novo meio de coleta de assinaturas, a sigla reuniria as quase 500 mil assinaturas necessárias em 3 a 4 meses – a tempo de lançar candidatos nas eleições municipais de 2020.

Uma reunião com parte da bancada do PSL na Câmara está marcada para as 16h de hoje, no Palácio do Planalto. Jair Bolsonaro teria aprovado o nome “Aliança pelo Brasil” na semana passada.

A reunião de Bolsonaro com os deputados ocorre num momento de grande desgaste entre o ocupante do Planalto e o presidente do PSL, o deputado pernambucano Luciano Bivar.

Há pouco mais de um mês, em 8 de outubro, Bolsonaro foi filmado em frente ao Palácio da Alvorada dizendo a um jovem apoiador para “esquecer” o PSL e também Bivar. O pernambucano estaria “queimado pra caramba”, segundo o presidente. Há a possibilidade de que Bolsonaro anuncie publicamente sua saída do PSL.

Se isto acontecer, será a primeira vez que um presidente deixa o próprio partido no período da Nova República (iniciado em 1985).

Neste momento, pessoas ligadas a ele estão trabalhando para terminar de redigir os documentos da nova sigla, como o Estatuto do futuro partido. Também estão sendo confeccionados o site e o aplicativo de celular para a coleta de assinaturas.

De acordo com o projeto, a assinatura via celular estaria disponível para qualquer pessoa cujo smartphone possua um leitor de impressões digitais – hoje, esse dispositivo é usado por aplicativos de bancos, por exemplo. Quem não tenha acesso a esta tecnologia precisaria ir a um local fixo, caso deseje assinar.

Os defensores da proposta dizem que usarão o recesso do Judiciário – de 20 de dezembro até 6 de janeiro – para mover uma campanha na internet em busca de apoiamentos. A ideia é reunir as assinaturas necessárias dentro deste prazo. O registro do novo partido seria pedido ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já em janeiro de 2020.

Luciano Bivar

“Aliança pelo Brasil é um nome que tem tudo a ver com muitas pautas do presidente. As alianças do matrimônio, a aliança que Jesus fez com a Igreja, a Tríplice Aliança (1864-1870) dos militares, a aliança a ser construída com os eleitores e com os parlamentares, a aliança entre os poderes. Fazer uma composição em prol do país”, explica uma pessoa próxima ao projeto.

A coleta digital é válida?

Segundo os defensores da ideia, a resolução atual do TSE que rege a criação de partidos políticos já permite o uso de meios digitais – o tribunal já utiliza um sistema informatizado para organizar a criação de novas legendas. “A gente traria só um pouquinho mais de tecnologia”, diz uma pessoa que acompanha o caso.

A última alteração nessa resolução ocorreu em junho de 2018, e foi relatada pelo então ministro Admar Gonzaga- que hoje é um dos advogados eleitorais de Bolsonaro.

Além da rapidez, outra vantagem seria a maior segurança do processo digital – haveria menos chances da Justiça Eleitoral rejeitar assinaturas coletadas de forma biométrica.

Apesar do que dizem os defensores da ideia, há dúvidas sobre se o entendimento atual da Justiça Eleitoral permite este novo tipo de coleta de assinaturas.

Em dezembro de 2018, o deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) formulou uma consulta ao TSE sobre a possibilidade de usar um outro mecanismo – a chamada assinatura digital – para coletar apoios a um novo partido. A consulta ainda não foi decidida pela corte.

Bancada dividida

Quem se encarregou de chamar os deputados do PSL para a reunião foi a deputada Bia Kicis (PSL-DF).

Mas nem todos os representantes do PSL na Câmara foram chamados: aqueles que nos últimos meses apoiaram o atual presidente do PSL, Luciano Bivar, foram deixados de fora. É o caso de Delegado Waldir (GO), ex-líder do partido; Joice Hasselmann (SP), ex-líder do governo no Congresso, entre outros. O senador Major Olímpio (PSL-SP) também não foi convidado.

A divisão reflete o que deve acontecer com a atual bancada social-liberal caso Bolsonaro realmente saia: ela deve se dividir ao meio. Uma parte ficará no PSL, e outra acompanhará o capitão reformado do Exército.

Joice Hasselmann (SP)

A reportagem da BBC News Brasil conversou com alguns deputados pesselistas na tarde desta segunda-feira (11). Os que foram chamados disseram que a convocatória da reunião era vaga. Dizia apenas que o assunto era o PSL.

“É para tratar da questão do PSL. Agora, detalhes, eles não deram”, disse o deputado pesselista Sanderson (RS) – um dos convidados para o encontro.

Perguntado se sairia do PSL para se filiar ao novo partido, Sanderson foi taxativo: “Saio. Vou direto para o partido do presidente, inclusive com perda de tempo de televisão e abrindo mão do Fundo Partidário”, disse ele.

A resposta foi muito diferente quando a pergunta foi feita ao Delegado Waldir (PSL-GO). Bolsonaro “que vá com Deus”, disse.

“O Bolsonaro no cargo de presidente é uma ‘cria’ do PSL. Agora, ele está chutando essa ‘mãe’ dele”, diz o deputado goiano – no auge da tensão dentro da bancada, em meados de outubro, Waldir foi gravado em uma reunião dizendo que iria “implodir o presidente”. Na época, vazaram áudios de Jair Bolsonaro negociando com deputados do partido para que apoiassem seu filho, Eduardo Bolsonaro (SP), como líder da bancada.

Segundo Waldir, a sigla deve continuar, pelo menos por enquanto, sendo a casa dos atuais 53 deputados. “Nos próximos dias vamos finalizar a suspensão de alguns deles (da ala contrária a Luciano Bivar)”, disse.

“Vamos ver (depois) como vão ser as orientações em plenário. As pautas que interessam ao Brasil, vamos estar juntos. Mas em algumas outras não iremos acompanhar”, diz.

Deputados lutariam para manter mandatos e não levam o Fundo

Advogada especialista em direito eleitoral, Vânia Aieta diz que regra atual é a de que os mandatos de cargos proporcionais (como deputados federais) pertencem aos partidos, e não aos congressistas, individualmente.

Para os cargos majoritários (como o de presidente da República, governadores e senadores) não há regra de fidelidade partidária: podem sair quando quiserem, segundo entendimento firmado em 2015 pelo STF.

Caso um grupo de deputados federais decida sair do PSL, o partido teria o direito de ingressar com ações judiciais no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para reter os mandatos.

As ações seriam sorteadas entre os ministros e julgadas individualmente, caso a caso, segundo disse Aieta à BBC News Brasil em outubro deste ano.

Há duas hipóteses nas quais os deputados poderiam manter seus cargos: se conseguirem provar que o partido mudou sua linha ideológica e programática de forma brusca, motivando a saída; ou se mostrarem que foram vítima de perseguição ou discriminação dentro do partido, diz ela, que é professora de direito eleitoral da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Pelas regras atuais, os deputados do PSL também não levariam para o novo partido os recursos do Fundo Partidário ou o tempo de TV e rádio durante as campanhas eleitorais.

Jair Bolsonaro

Também em outubro, o advogado especialista em direito eleitoral Daniel Falcão disse à BBC News Brasil que a lei da “minirreforma eleitoral” só permite aos deputados levar sua fatia no Fundo em uma hipótese: quando a migração se dá pelo fato do partido anterior não ter atingido a chamada “cláusula de barreira”.

A cláusula é uma regra criada em 2017 para diminuir o número de partidos no país.

Não há no texto sancionado da “minirreforma”, sancionada por Bolsonaro em setembro, nenhuma regra que permita aos deputados levar para o novo partido os recursos.

O tema é regulamentado pela Lei dos Partidos Políticos, de 1995. “Tanto no caso do Fundo Partidário, quanto do Fundo Eleitoral, o momento de aferição dos votos é a eleição anterior,” disse à BBC a especialista em direito eleitoral e professora da Escola Superior Dom Helder Câmara, Lara Ferreira.

No caso do Fundo Partidário, a distribuição entre os partidos é a seguinte: 5% de forma igualitária para todos os partidos; e 95% de acordo com os votos na última eleição para a Câmara dos Deputados.

No Fundo Eleitoral (FEFC) a conta é um pouco mais complexa: 2% para todas as siglas; 35% de acordo com a votação para a Câmara; 48% de acordo com número de deputados; e 15% de acordo com o número de senadores.

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