Parece uma eternidade, e não se passaram mais de vinte dias desde que o governo do Estado de São Paulo decretou, pioneiramente no Brasil, severas medidas de distanciamento social para combater a pandemia de Covid-19. A partir daí, o país parou, com algumas distinções em cada região — congelamento necessário, imposto pelo mantra que atravessa o mundo, ancorado em três palavrinhas mandatórias: fique em casa. E é para ficar mesmo. Mas até quando teremos de estar confinados? Ou, em outros termos: quando conseguiremos retomar o cotidiano de modo relativamente normal, sem riscos para a saúde, mas em ritmo que autorize ar respirável e luz para a economia? Não há, evidentemente, uma resposta clara, muito menos única.
No entanto, a curva de casos, mortes e, sobretudo, recuperações em países que chegaram antes ao drama, além de vastos estudos de epidemiologia e projeções matemáticas, oferece um cauteloso — cauteloso, insista-se — otimismo. Um modo inaugural de enxergar alguma saída é olhar para a região de Hubei, na China, epicentro do espraiamento do coronavírus, identificado pela primeira vez logo depois do Natal de 2019, então como “uma pneumonia atípica de causa desconhecida” e que, na quinta-feira 2, tinha alcançado a triste marca de mais de 1 milhão de casos, 8 000 deles no Brasil. Em 23 de janeiro, a cidade mais populosa do condado chinês — Wuhan — entrou em um processo chamado de “isolamento sanitário”. Tudo fechou — ruas, escolas, estabelecimentos comerciais. Em 24 de março, depois de exatos dois meses, a pétrea decisão foi levantada.
Aos poucos, os meios de transporte público em Wuhan começam a funcionar, com usuários de máscara, e as aulas são retomadas gradativamente (embora as salas de cinema permaneçam com cadeados). Vive-se, enfim, fora do enclausuramento — ainda que com receio permanente. Tudo somado, eis uma perspectiva, empírica, baseada no exemplo da China: temos ainda pelo menos outro mês de quarentena no Brasil. Se o cálculo levar em conta a eclosão do primeiro caso, aplicando-se a toada por aqui, o prazo se estenderá por mais trinta dias. Seria plausível, portanto, o restabelecimento da normalidade a partir do fim de maio, início de junho. Mas não para todos ao mesmo tempo. O provável, segundo expectativa de técnicos do Ministério da Saúde, não revelada oficialmente: a normalidade mesmo só voltará em setembro. Diz Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, em São Paulo, uma das vozes mais respeitadas do país quando se fala de vacinas, interlocutor preferencial das autoridades de saúde: “Se seguirmos rigorosamente a orientação de afastamento, evitando a circulação de pessoas, poderemos ter um quadro positivo lá na frente”. Por ora, não — e espera-se um salto de internações nos próximos quinze dias.
A experiência chinesa, em que pese a possibilidade de um segundo e até mesmo um terceiro surto, representa uma janela de horizonte. Embora seja compulsório registrar as diferenças: a ditadura mandou prender quem ousasse abrir a porta para a rua; havia testes em profusão, separando sãos de enfermos; e deu-se, é sempre bom sublinhar, uma exibição da extraordinária capacidade de movimentação oriental, que ergueu em apenas dez dias um hospital com 1 600 leitos. Ainda assim, apesar das evidentes discrepâncias, trata-se de um bom espelho.