Mais três testemunhas prestaram depoimento, nesta quarta-feira (13), no inquérito que apura a suposta tentativa do presidente Jair Bolsonaro de interferir politicamente na Polícia Federal. Uma das testemunhas é o delegado que o presidente queria tirar da superintendência da PF no Rio.
O delegado Carlos Henrique Oliveira, até esta terça (12) superintendente da Polícia Federal e nomeado nesta quarta (13) diretor-executivo da PF, desmentiu o presidente Bolsonaro em dois trechos do depoimento.
Primeiro, ao falar sobre seu antecessor, Ricardo Saadi. Em agosto de 2019, o presidente Jair Bolsonaro disse que queria trocá-lo da superintendência da PF no Rio por problemas de gestão e produtividade, e isso resultou na substituição de Saadi.
No depoimento, Carlos Henrique Oliveira, que o sucedeu, disse que “não havia problemas de produtividade, pois a SR/RJ vinha evoluindo, tendo alcançado sua melhor classificação durante a gestão do delegado Saadi”.
Um segundo ponto em que Carlos Henrique desmente a versão do presidente é sobre investigações da PF relacionadas à família de Bolsonaro. Nesta terça-feira (12), o presidente disse: “A Polícia Federal nunca investigou ninguém da minha família, certo? Isso não existe no vídeo. Estão sendo mal informados”, afirmou.
Nesta quarta, o delegado Carlos Henrique, perguntado se tem conhecimento de investigações sobre familiares do presidente nos anos de 2019 e 2020 na superintendência da PF no Rio, disse que tem conhecimento de uma investigação no âmbito eleitoral, cujo inquérito já foi relatado, não tendo havido indiciamento.
Flávio Bolsonaro, filho do presidente, foi alvo de uma investigação eleitoral que já foi relatada pela Polícia Federal e trata de uma suspeita de enriquecimento ilícito de Flávio no ramo imobiliário. O inquérito foi encaminhado para a Justiça Eleitoral, sem indiciamento.
Carlos Henrique Oliveira afirmou que indicou o novo superintendente da Polícia Federal no Rio, Tácio Muzzi. No depoimento, ele reforçou também que a segurança do presidente não é feita por policiais federais.
Na reunião ministerial do dia 22 de abril, o presidente diz que, quando fez uma cobrança sobre a segurança do Rio, se referia à sua segurança e de sua família no estado; que, perguntado sobre a participação de policiais federais no Rio de Janeiro na segurança de familiares do presidente, disse que não há, ao seu conhecimento, essa participação, pois quem faz a segurança pessoal é o GSI.
Outro delegado da Polícia Federal que prestou depoimento em Brasília foi Alexandre Saraiva. Alexandre Saraiva falou à sede da Polícia Federal em Brasília, disse que foi sondado em 2018 para assumir o Ministério do Meio Ambiente, e que chegou a se reunir com o presidente Jair Bolsonaro sobre isso. Ele explicou que a sondagem ocorreu depois da eleição – Bolsonaro foi eleito em 2018. Disse também que é amigo de Alexandre Ramagem, o diretor geral da Abin que foi impedido pelo Supremo Tribunal Federal de assumir o comando da PF.
Nesse depoimento, Alexandre Saraiva falou sobre o interesse do presidente em nomeá-lo superintendente da PF no Rio de Janeiro. Disse que, “no início do segundo semestre de 2019, recebeu uma ligação de Ramagem, perguntando ao depoente se ele aceitaria assumir a superintendência da Polícia Federal no Rio, ao que depoente prontamente aceitou”; que “não se recorda qual cargo que Ramagem ocupava à época desse telefonema, porém recorda-se dele ter afirmado que o presidente Jair Bolsonaro tinha alguns nomes para sugerir ao ex-ministro Sergio Moro para ocupar a função”; que “o depoente afirmou a Ramagem que evidentemente aceitaria o convite”.
O delegado não explicou, também não foi questionado, por que Alexandre Ramagem, diretor-geral da Abin, estava fazendo sondagens sobre cargos de outros órgãos, nesse caso, a Polícia Federal.
No segundo semestre de 2019, Alexandre Saraiva era o nome preferido do presidente Jair Bolsonaro para assumir a superintendência da PF no Rio e, no depoimento, Saraiva disse o seguinte: que “teve um novo encontro com o então ministro Sergio Moro no aeroporto de Manaus, oportunidade em que o depoente foi inquirido pelo então ministro nos seguintes termos: ‘Saraiva, que história é essa de você no Rio de Janeiro?’, ao que o depoente respondeu ter recebido a ligação telefônica acima relatada de Ramagem, tendo feito na ocasião a mesma ressalva relacionada ao prévio acerto com o diretor-geral da Polícia Federal como condição para assumir a superintendência da PF no Rio”.
Saraiva alegou que não tem qualquer vínculo de amizade com o Presidente da República nem com seus familiares, e que essa sondagem de seu nome para a PF no Rio, assim como os demais convites que lhe foram formulados ao longo da carreira, inclusive pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo então ministro Moro, não se revestiam de nenhuma missão ou intenção pontual e específica de interesse das referidas autoridades, pois se assim o fosse o depoente prontamente rechaçaria.
E, ao contrário dos outros delegados que prestaram depoimento nesse inquérito, e apesar de trabalhar no Amazonas, Alexandre Saraiva, que assim como Bolsonaro, criticou também a produtividade da Polícia Federal no Rio de Janeiro. Disse o seguinte: “indagado se, nas conversas com o Dr. Ramagem foi relatada ao depoente alguma preocupação em relação à produtividade da superintendência do Rio, o depoente esclarece que não, embora todos que conheçam a superintendência no Rio saibam que a produtividade daquela unidade, na realidade, ‘não é lá essas coisas’, e que o índice de produtividade operacional daquela superintendência, que saltou da 24ª para a 4ª posição, não traduz, de fato, a realidade operacional da unidade”.
Também nesta quarta (13), em Brasília, prestou depoimento a deputada federal Carla Zambelli, do PSL de São Paulo. Ela enviou mensagens na véspera do pedido de demissão do então ministro Sergio Moro, enviou mensagens a ele discutindo a possibilidade de que ele permanecesse no cargo e fosse eventualmente indicado à vaga no Supremo Tribunal Federal. Aos investigadores, a deputada disse que as mensagens tinham o objetivo de incentivar Moro a permanecer no cargo.
Zambelli também disse que não chegou a ter qualquer conversa com o presidente Jair Bolsonaro no sentido de Moro aceitar a substituição na direção da Polícia Federal em troca da vaga no STF, e que também não chegou a ter qualquer conversa com pessoas em nome do presidente no sentido de Moro aceitar a substituição.
Só que, mais à frente no depoimento, a deputada relata que, naquele mesmo dia em que enviou as mensagens a Moro, entrou em contato com o secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten, e que ambos sugeriram que ela continuasse a manter contato com Sergio Moro, “fazendo o possível” para que o mesmo permanecesse como ministro.
Em outro ponto do depoimento, a deputada federal Carla Zambelli é perguntada se já havia questionado o ministro Moro em relação a alguma investigação específica. A deputada disse que chegou a mandar ao ministro uma notícia sobre a investigação relacionada ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, mas que a intenção era apenas saber se a responsabilidade pela investigação era da Polícia Federal, e que a pergunta partiu dela, deputada Carla Zambelli, e não do presidente Jair Bolsonaro por meio dela.