Cientistas testarão uma droga experimental que pode, potencialmente, prevenir os coágulos sanguíneos fatais associados à Covid-19.
O experimento, financiado pela Fundação Britânica do Coração, vai colocar à prova a teoria de que os coágulos são causados por um desequilíbrio hormonal disparado pela infecção do novo coronavírus.
Este será mais um entre os diversos tratamentos em estudo ao redor do mundo contra a doença, e integra um grupo que mira um aspecto relevante da pandemia: a resposta imunológica do corpo à Covid-19, que pode resultar em uma inflamação por vezes fatal.
Um terço dos pacientes hospitalizados com Covid-19 desenvolvem perigosos coágulos sanguíneos.
Esses coágulos podem afetar órgãos como pulmão, coração ou cérebro, e causar infartos ou AVCs, com consequências fatais.
A droga, batizada inicialmente de TRV027, atua para reequilibrar os hormônios ligados à pressão sanguínea, à água e ao sal.
Pesquisadores do Imperial College de Londres, envolvidos no experimento, acreditam que quando o vírus entra no corpo, ele usa uma enzima para lidar com a entrada nas células.
A droga desativa a enzima, que desempenha um papel de peso no balanceamento de hormônios importantes no organismo. Para os cientistas, a TRV027, desenvolvida pela empresa biofarmacêutica Trevena, que teve entre seus cofundadores o prêmio Nobel de Química de 2012, Robert Lefkowitz, pode assumir essa função de equilíbrio.
Segundo David Owen, um dos coordenadores do estudo com a droga experimental, esse desequilíbrio hormonal pode fornecer pistas para a questão: por que algumas pessoas ficam gravemente doentes de Covid-19 e outras não?
A coagulação do sangue também pode explicar por que o novo coronavírus parece afetar particularmente pessoas que já têm doenças cardiovasculares, apesar de ser uma doença respiratória, afirmou a Fundação Britânica do Coração.
Hipóteses de causas
Ainda não há consenso sobre o que está causando os coágulos em pacientes com Covid-19.
Coagulação do sangue também pode explicar por que o novo coronavírus parece afetar particularmente pessoas que já têm doenças cardiovasculares — Foto: EPA
Em entrevista à BBC News Brasil no fim de abril, o cirurgião Craig Coopersmith, que é especialista em tratamento intensivo e professor da Escola de Medicina da Universidade Emory, em Atlanta, afirmou que há múltiplos fatores que devem estar presentes para que o sangue coagule e que o corpo está constantemente buscando um equilíbrio delicado entre coagular e sangrar.
Não se sabe se os coágulos são causados pelo coronavírus ou por uma resposta do sistema imunológico para combater o vírus. Além disso, muitos dos doentes estão imobilizados, o que também aumenta o risco de coagulação.
Segundo o médico especialista em doenças pulmonares Hooman Poor, professor da Escola de Medicina Icahn, braço acadêmico do sistema hospitalar Mount Sinai, em Nova York, ainda não se sabe se os coágulos são apenas um efeito colateral do que está acontecendo com os pacientes ou se estão provocando a falência de órgãos.
Alguns hospitais administram anticoagulantes para todos os pacientes que estejam internados com Covid-19. Mas especialistas alertam que esse tipo de tratamento requer muito cuidado, já que pode aumentar o risco de sangramento, e ressaltam que são necessários mais estudos.
Experimentos com diversas drogas
Tendo em vista que a Covid-19 é uma doença complexa que afeta diversas partes do corpo humano, esse tratamento experimental citado acima pode ser também combinado com outras drogas, explica a pesquisadora Kat Pollock, do Imperial College.
No experimento, quase 60 pacientes serão divididos em dois grupos. Um vai receber a droga experimental e o outro, placebo.
A TRV027 é apenas uma entre diversas drogas em estudo para tentar reduzir os piores efeitos da doença ou ajudar o corpo humano a combatê-la.
Há estudos sobre ao menos 10 drogas antivirais, incluindo a combinação usada no tratamento do HIV (lopinavir/ritonavir). Até agora, nenhuma delas se mostrou realmente eficaz isoladamente. Mas especialistas estimam que algumas combinações podem surtir efeito para abreviar a infecção.
O remdesivir, uma droga que apresentou resultados promissores contra a Covid-19, atua atacando a enzima que o vírus precisa para se replicar dentro das células.
Por outro lado, o plasma (parte líquida do sangue) retirado de pessoas que já se recuperaram do novo coronavírus pode também ajudar pacientes infectados, ao oferecerem a esse grupo os anticorpos certos para combater a Covid-19.