Automedicação com corticoide pode diminuir defesa do corpo e agravar complicações da Covid-19

Pesquisa preliminar da Universidade de Oxford aponta a dexametasona como 1º remédio capaz de reduzir mortes por Covid-19 em casos graves. Remédios tem efeitos colaterais severos e NÃO deve ser usado em pacientes leves ou como forma de prevenção.

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Os principais riscos da automedicação com corticoides são a diminuição da defesa do corpo (imunidade) e a complicação de outras doenças já existentes ou até mesmo o surgimento de novas, alertam os especialistas. Em algumas situações, tomar corticoides sem receita pode até mesmo ajudar que o novo coronavírus se multiplique e ganhe força em sua “invasão” ao organismo.

Uma pesquisa preliminar da Universidade de Oxford aponta que a dexametasona – um corticoide barato e de fácil acesso – é o primeiro remédio capaz de reduzir mortes por Covid-19 em casos graves. Mas os cientistas alertam que ele só foi usado em casos graves (pacientes intubados ou que estavam com apoio de oxigênio) e NÃO deve ser usado em pacientes leves ou como forma de prevenção.

Nesta quarta-feira (17), o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, e o diretor de emergências da organização, Michael Ryan, destacaram os riscos. “Essa droga é um anti-inflamatório muito, muito poderoso. Pode resgatar pacientes que estão em condição muito grave, quando os pulmões e o sistema cardiovascular estão muito inflamados. Ela permite, talvez, que os pacientes consigam oxigenar o sangue em um período muito crítico, ao rapidamente reduzir a inflamação em um período muito crítico da doença”, esclareceu o diretor de emergências.

“Não é uma prevenção. Na verdade, esteroides, principalmente esteroides poderosos, podem ser associados à replicação viral. Em outras palavras, eles podem facilitar a divisão e a replicação do vírus”, disse Michael Ryan

“Então, é excepcionalmente importante, neste caso, que essa droga seja reservada a pacientes gravemente doentes, que podem se beneficiar dessa droga, claramente. Isso é uma ótima notícia, mas é parte da resposta de que nós precisamos clinicamente. Oxigênio, ventilação, o uso de antivirais, o uso de esteroides – e achar uma combinação de terapias que nos permita salvar a maior quantidade possível de pacientes”, explicou Ryan.

Corticoide que ajuda pacientes em estado grave não funciona como prevenção, alerta OMS

Não é para todos

O professor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp e membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo (SBEM-SP), Cláudio Kater, disse ao G1 que o uso arbitrário de corticoides tem alto risco e pode levar ao desenvolvimento de hipertensão e diabetes.

Ele explicou também que o excesso de cortisol do organismo dá aos pacientes sintomas semelhantes aos da doença conhecida como Síndrome de Cushing, uma alteração metabólica que em casos extremos pode até levar à morte.

“O indivíduo que é diabético, vai piorar o diabetes, o hipertenso tem descontrole da pressão arterial, outros ganham peso e podem ter muitos problemas quanto a isso”, disse o especialista. “O uso desse medicamento não deve ser feito por leigos, tem que ter acompanhamento médico e não está indicado, como prevenção e sim para indivíduos hospitalizados.”

Kater disse também que medicamentos a base de corticoides, como é o caso da dexametasona, já foram contraindicados para epidemias anteriores. Ele lembrou que nas viroses Sars e Mers, por exemplo, a OMS lançou um comunicado alertando que seu uso prejudicava a evolução dos pacientes. Ele reforçou que os resultados dos estudos para a Covid-19 ainda são preliminares e controlados.

Médico sobre uso indiscriminado de corticoide: ‘risco de aumento de complicação viral’

O médico intensivista Bruno Tomazini, do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, explica que podem ser graves as complicações da automedicação.

“Na farmácia, por ela ser de fácil acesso, talvez a gente acredite que seja um anti-inflamatório comum. Não é. É um anti-inflamatório super potente que pode, em alguns pacientes, desde aumentar a concentração de açúcar no sangue, para alguns ele induz edema, retenção de líquido, hipertensão, e, acima de tudo, por ele diminuir a resposta do organismo a uma infecção, ele pode gerar um comprometimento do sistema imune”, explica Tomazini.

“Em estudos prévios, em outras doenças virais, como a influenza, a Mers e a Sars, alguns estudos mostravam que o uso de corticoide de maneira indiscriminada aumentava a replicação viral. Então se a pessoa usa no momento errado – que a gente acredita que seja quando a pessoa tem o quadro clínico leve -, isso pode de fato aumentar a replicação viral e piorar a situação mais para frente”, diz o intensivista.

Alerta da revista Nature

Em um artigo publicado nesta quarta-feira (17), a revista científica “Nature” celebrou a descoberta, mas ponderou os riscos de efeitos colaterais do uso deste medicamento sem prescrição.

“Os medicamentos suprimem o sistema imunológico, o que poderia proporcionar algum alívio aos pacientes cujos pulmões são devastados por uma resposta imune hiperativa que às vezes se manifesta em casos graves de Covid-19”, explica. “Mas esses pacientes ainda podem precisar de um sistema imunológico totalmente funcional para combater o próprio vírus.”

Agravamento da diabetes e osteoporose, entre outras doenças

A infectologista Rosana Richtmann, do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo os corticoesteroides podem piorar quadros como diabetes e osteoporose, afirma . Por isso, é importante que as pessoas NÃO tentem a automedicação com a substância, lembra a especialista.

O médico Luciano Azevedo, do Hospital Sírio-Libanês, reforça a recomendação. Ele disse que toda vez que a comunidade científica divulga uma pesquisa como a do medicamento, se gera uma “corrida às farmácias” porque muitas pessoas acham que podem tomar como prevenção.

“Não faz o menor sentido usar o corticoide nem como prevenção nem para pacientes em estado leve. Se tiver alguma indicação, é para os pacientes em estado grave, que precisam de oxigênio ou de respirador artificial” – Luciano Azevedo, médico do Hospital Sírio-Libanês

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