Reitores dizem que corte previsto para educação brasileira em 2021 pode inviabilizar atividades em universidades federais

MEC prevê redução de R$ 4,2 bilhões no orçamento da pasta em 2021. Desse total, R$ 1,4 bilhão atingiriam universidades e institutos federais.

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Em meio à readequação imposta pela pandemia, universidades e institutos federais de ensino deverão enfrentar em 2021 um obstáculo extra para a retomada das aulas presenciais: um orçamento ainda mais enxuto. A notícia da previsão de corte de R$ 1,43 bilhão nas verbas para as federais chega dentro de um quadro em que houve mais gastos com a expansão de vagas, sem que os recursos aumentassem na mesma proporção.

A retomada do ensino presencial durante a pandemia de Covid-19 agrava ainda mais a situação: reitores preveem gastos mais altos com a compra de equipamentos de proteção, reforços nas equipes de limpeza e adaptações nas salas de aula e nos sistemas de ventilação.

Nessa última segunda (10) o Ministério da Educação disse que, dos R$ 4,2 bilhões que podem sair do orçamento do ano que vem, R$ 1 bilhão deixará as mãos das universidades e R$ 434,3 mil, dos institutos federais. O número de matriculados nessas instituições totaliza 1,2 milhão de estudantes.

O MEC ainda não detalhou quais serão outras áreas (educação básica, por exemplo) e programas atingidos pelos outros R$ 2,75 bilhões restantes do total de R$ 4,2 bilhões que deixariam o orçamento.

As reduções ocorrerão nas despesas discricionárias – aquelas que não são obrigatórias e podem, por lei, serem remanejadas. São despesas como água, luz, contratação de terceirizados (limpeza e segurança, por exemplo), obras e reformas, compras de equipamentos, realização de pesquisas e até a assistência estudantil. Os cortes não afetam as despesas obrigatórias, como salários de funcionários e aposentadorias, que fazem do orçamento dessas instituições.

“Estamos há três anos com o orçamento nominalmente congelado. As despesas têm ajustes anuais. Além disso, o corte ocorre em um ano que deveria ter aumento de recursos. As aulas vão voltar com álcool em gel, sabão, papel, equipamentos de proteção. Será preciso mexer na estrutura da universidade para garantir o distanciamento. Haverá gastos no pós-pandemia”, afirma Edward Madureira Brasil, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), que representa 68 universidades federais.

“Todas as gorduras que tínhamos para eliminar – vigilância, diárias, estágios, visitas técnicas – nós tivemos que reduzir nesses últimos anos. Não tem a menor chance de conseguirmos tocar as instituições. É uma situação grave, gravíssima”, afirma Jadir Jose Pela, presidente do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), que representa 653 campi universitários pelo Brasil.

Em nota (veja íntegra mais abaixo) sobre a previsão do corte de R$ 4,2 bilhões, o MEC diz que “a Administração Pública terá de lidar com uma redução no orçamento para 2021, o que exigirá um esforço adicional na otimização dos recursos públicos”.

Declara também que “liberou recursos adicionais para as universidades voltados a projetos de redução de despesas como, por exemplo, painéis fotovoltaicos, vigilância eletrônica, conclusão de obras para redução de aluguéis, ações de inovação, combate à pandemia da Covid-19, conectividade à internet, entre outras”.

Sem proteção para a volta às aulas

Segundo o MEC, a crise econômica causada pela pandemia provocou a redução na arrecadação e, consequentemente, no orçamento.

Por outro lado, segundo as universidades, a Covid-19 trará aumento nos gastos do ensino superior quando as aulas presenciais forem retomadas.

Para Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), as consequências para a reabertura serão “desastrosas”.

“Os gastos com assistência estudantil aumentaram” já com o ensino remoto, diz Raupp. Segundo ele, na volta às aulas presenciais, ainda haverá as despesas com equipamentos de proteção individual (EPIs) e com os cuidados sanitários.

“Há estimativas de que os gastos para a retomada, só em limpeza, podem ser de 30% a 50% maiores. Estamos arcando sozinhos com os custos e, agora, ainda somos surpreendidos com a redução para 2021”, afirma Raupp.

“Um retorno presencial sem vacina fica praticamente impossível, porque não teremos como investir em protocolos seguros para o retorno”, avalia Eduardo Raupp, pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ.

Na Universidade de Brasília (UnB), a preocupação com os cortes também é maior por causa da volta às aulas. “A instituição busca viabilizar a aquisição de insumos, como álcool gel e equipamentos de proteção individual, além de garantir a inclusão digital efetiva dos estudantes em situação de vulnerabilidade econômica”, afirma, em nota.

“Quando houver a retomada de atividades presenciais, os desafios serão ainda maiores. A instituição terá de adequar sua infraestrutura, para assegurar ventilação e distanciamento social”, diz.

‘Insustentável’

De acordo com Raupp, pró-reitor da UFRJ, todos os programas (assistência estudantil, bolsas de iniciação científica, atividades de extensão e de monitoria) e atividades essenciais (limpeza, manutenção, segurança e investimentos em infraestrutura) poderão ser afetados.

“A universidade terá de suspender serviços e encerrar atividades. A UFRJ teria uma redução de R$ 70 milhões, em termos nominais, sem a correção da inflação. Nosso orçamento que, antes, só cobria 10 meses por ano, não chegará nem à metade”, afirma. “Teremos de fazer cortes drásticos, justamente quando a sociedade mais precisa dos nossos serviços.”

O reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Carlos Salles, informa que o corte previsto na instituição será de R$ 30 milhões, equivalente a 18,32% do orçamento de 2020. “É um corte inaceitável e insustentável para as universidades”, diz.

Congresso pode alterar

Por enquanto, o corte é uma previsão – faz parte do Ploa (Projeto de Lei Orçamentária Anual), elaborado pelo Ministério da Economia. É um plano de como o governo planeja gastar o dinheiro no ano seguinte: estabelece, por exemplo, qual a quantia direcionada a cada área da educação. Depois, essa proposta precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional.

Como o projeto ainda não foi votado pelo Legislativo, pode ser que sofra alterações. Entidades representativas das universidades e institutos federais de ensino, como Andifes e Conif, afirmam que vão tentar reverter o corte no Congresso, durante a tramitação do orçamento.

Marcelo Carneiro Leão, da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), prevê que será uma “batalha” no Congresso.

“Temos de mobilizar a bancada de deputados federais de Pernambuco”, diz. “Caso seja aprovado, esse corte vai representar menos R$ 16 milhões ou R$ 17 milhões para a universidade. Isso significa que as atividades ficariam inviabilizadas”, completa.

A pró-reitoria da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) também informou que tentará evitar os cortes. “A administração geral da universidade atuará junto à bancada capixaba para tentar reverter isso”, afirma o órgão.

O que diz o MEC

Questionado especificamente sobre o corte nas universidades e institutos federais de ensino, o MEC não respondeu até a publicação desta reportagem.

Sobre o corte no orçamento geral da pasta, o ministério enviou a seguinte nota:

“O Ministério da Educação informa que, conforme Referencial Monetário recebido pelo Ministério da Economia, a redução de orçamento para suas despesas discricionárias foi de 18,2% frente à Lei Orçamentária Anual 2020 sem emendas. Esse percentual representa aproximadamente R$ 4,2 bilhões de redução.

É importante ressaltar que houve um simples ajuste de despesa, no qual os recursos que estavam sob o controle do Ministério da Saúde (R$ 278,8 milhões), para Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (Rehuf), foi alocado no MEC. Tendo em vista a peculiaridade dessa transferência e a finalidade específica do gasto (que estava comportado no orçamento do Ministério da Saúde), não se contabiliza nos números acima essa realocação.

A redução do orçamento é apresentada no Projeto de Lei Orçamentária Anual 2021, a ser encaminhado ao Congresso Nacional pela Presidência da República ainda este ano.

A redução para as universidades federais será a mesma aplicada para o MEC nas suas fontes do tesouro, ou seja, 18,2%. Isso representa aproximadamente R$ 1 bilhão. Ressalta-se que as fontes próprias das universidades dependem do potencial arrecadador e da estimativa apresentada por cada universidade em separado. Dessa forma, não houve corte para as receitas próprias por parte do MEC.

Em razão da crise econômica em consequência da pandemia do novo coronavírus, a Administração Pública terá que lidar com uma redução no orçamento para 2021, o que exigirá um esforço adicional na otimização dos recursos públicos e na priorização das despesas.

Objetivando minimizar o impacto da redução do orçamento para 2021, além da liberação de 100% dos recursos alocados diretamente nas universidades federais na LOA de 2020, o MEC liberou recursos adicionais para as universidades voltados à projetos de redução de despesas como, por exemplo, painéis fotovoltaicos, vigilância eletrônica, conclusão de obras para redução de aluguéis, ações de inovação, combate à pandemia da Covid-19, conectividade à internet, entre outras, que totalizaram aproximadamente R$ 450 milhões.”

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