Circula pelos grupos de WhatsApp dos caminhoneiros um áudio do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, em que ele aparece dizendo que não vai atender a nenhum item da pauta dos motoristas que anunciaram greve para amanhã. A fala do representante do governo está sendo muito criticada e inflamou ainda mais o movimento.
A conversa teria ocorrido ontem. A um representante da categoria, que se identifica como vice-presidente da associação de caminhoneiros da cidade gaúcha de Capão da Canoa, Freitas diz ser impossível não só atender as reivindicações atuais, como também fiscalizar o cumprimento dos benefícios conquistados pelos caminhoneiros na greve de 2018.
Naquela ocasião, a paralisação foi apoiada pelo então candidato a presidente Jair Bolsonaro. Depois do movimento, a maior parte da categoria anunciou que votaria nele.
Entre outras coisas, o ministro diz ao interlocutor que os caminhoneiros precisam “desmamar” do governo, afirma que os integrantes da categoria devem pensar como empresários, cita entre os obstáculos econômicos prefeitos e governadores que “fecharam tudo” (referência a localidades que tiveram lockdown para conter a pandemia) e levanta a suspeita de a paralisação ter motivação política, por estar marcada para o mesmo dia da votação da presidência da Câmara dos Deputados.
No início da conversa, Freitas lembra ao interlocutor que sempre recebeu os representantes da categoria para ouvi-los. “Achar que tem que fazer paralisação para conversar… esquece. Na verdade, a paralisação fecha portas”, diz Freitas. “Enquanto tiver a paralisação eu não converso com ninguém”.
Muitos participantes dos grupos de caminhoneiros, porém, comentam que desde o início do governo fazem reuniões que não resultam em medidas concretas.
Os motoristas pedem isenção de impostos nos derivados de petróleo, para derrubar as despesas com combustível, pneus e itens de manutenção; fiscalização nas estradas que garanta o cumprimento da lei que estabelece piso mínimo do frete; gratuidade nos pedágios e outros itens.
Ao ser cobrado sobre o cumprimento do valor básico do transporte, Freitas diz que nada pode fazer. “A fiscalização não é efetiva e não vai ser nunca. Venderam pra vocês o piso mínimo de frete, que não vai funcionar nunca”, afirma. Ele diz que foram aplicadas 13 mil multas nos contratantes que descumpriram a lei, que de nada adiantaram.
“Como vai tirar o direito de um embarcador ou de uma transportadora de contratar mais barato?”, argumenta o titular da pasta da Infraestrutura. Em seguida, diz que o problema é de mercado, não de governo, e conclui que a greve de 2018 “deixou as empresas mais fortes”.
O representante dos caminhoneiros diz que os motoristas estão ganhando muito pouco e a situação está insustentável. Volta a pedir que o governo seja efetivo no cumprimento das leis existentes.
“Botaram esse negócio na lei, botaram um doce na boca do caminhoneiro para o caminhoneiro voltar a trabalhar em 2018”, responde o ministro. A seguir, Freitas fala das atuais dificuldades econômicas, diz que “o Brasil encolheu” e “passa por crise sem precedentes”.
O caminhoneiro lembra ao representante do governo que a categoria votou no presidente “na esperança de um Brasil melhor”.
Freitas volta a falar das dificuldades enfrentadas. “O presidente tá tomando porrada 24 horas por dia, os governadores e prefeitos fecharam todo o Brasil”, alega o ministro. “O presidente faz o que pode, mas o presidente está extenuado”.
Por fim, Tarcísio Gomes de Freitas levanta a hipótese de haver direcionamento político na greve, por ter sido marcada para o mesmo dia da eleição da presidência da Câmara dos Deputados.
O motorista responde que o movimento dos caminhoneiros só teve conotação política na eleição do presidente Jair Bolsonaro, em 2018. “Não estamos contra o governo, mas está insuportável para nós”, desabafou.
Nas dezenas de grupos de WhatsApp onde a greve vem sendo articulada, o áudio do ministro foi recebido com indignação. Muitos caminhoneiros autônomos fizeram críticas contundentes a ele e se disseram dispostos a parar as atividades amanhã.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.