O depoimento do deputado federal Osmar Terra à CPI da Pandemia é uma síntese do despreparo administrativo, da ignorância orgulhosa e do negacionismo criminoso do governo Bolsonaro, uma mistura que tem causado um mal enorme ao Brasil. Ele mentiu, reafirmou as mentiras e negou o que dissera publicamente.
Diante de vídeos que mostraram previsões furadas, nas quais minimizava o número total de mortos e o prazo de duração da pandemia, Terra (MDB-RS) não deu o braço a torcer.
Num momento, ele disse que suas previsões foram “conclusões pessoais” feitas com base nos dados que existiam na época. Depois, admitiu que divulgou prognósticos “otimistas” que não se confirmaram e evitou fazer novas previsões. “Ninguém sabe”, respondeu à indagação de quantos mais morreriam no Brasil.
Terra repetiu as fake news bolsonaristas de que lockdown não funciona e de que quarentena não salva vidas. Faltou com a verdade ao falar de imunizantes. “Sempre que eu tive vontade de falar com o presidente, eu defendi as vacinas”, disse.
Mentira.
Vídeo gravado em 8 de setembro do ano passado mostra Terra coordenando, no Palácio do Planalto, uma reunião na qual houve críticas à possibilidade de produção de vacinas e elogios à cloroquina e outros medicamentos que não funcionam contra a covid-19.
Sobre imunidade de rebanho, ele negou ter sido uma estratégia do governo. Disse que seria um caminho natural diante do grande número de infectados. Nesse ponto, ele seguiu a orientação jurídica para proteger o presidente Jair Bolsonaro e a si mesmo.
O fato é que Terra defendeu a imunidade de rebanho, fez previsões de que já havia percentual da população contaminado para baixar a taxa nacional de infecção e que a pandemia terminaria em breve. Nada disso aconteceu.
O relator Renan Calheiros (MDB-AL) voltou a exibir vídeos que desmentiriam Terra. Ele apareceu na tela inúmeras vezes dizendo que a pandemia só acabaria quando mais de metade da população tivesse se infectado e que nenhuma medida poderia enfrentar a doença com eficiência. O deputado respondeu que os vídeos foram “pinçados” e descontextualizados.
Foi constrangedor, porque os vídeos exibiram os raciocínios completos de Terra na defesa de teses indefensáveis. “Nós estamos discutindo aqui porque tenho opinião”, disse à CPI. Não se trata de debate sobre opiniões respeitáveis. Não há dois lados que mereçam crédito.
Existe o lado da ciência, que salva vidas. Terra está ao lado do negacionismo, que levou mais brasileiros a morrer e adoecer sem necessidade. Ele foi um dos principais responsáveis pela resposta negligentemente homicida de Bolsonaro à pandemia. Terra coordenou a montagem de um gabinete paralelo que orientou o presidente a sabotar as medidas de mitigação e desprezar a compra de vacinas.
Médico, Terra seguiu o discurso do governo ao atribuir a “novas cepas” o tamanho da tragédia no Brasil, que conta hoje mais de 500 mil mortos por covid-19. Essa é uma desculpa esfarrapada a fim de tentar acobertar os crimes do genocida e de seus cúmplices.
O deputado se contradisse o tempo. “Não tem como evitar o contágio”, disse. Na sequência, afirmou que “as pessoas têm de tomar as medidas de proteção” para evitar se contaminar.
Outra pérola: “Vírus não se comportam como bactérias. Se comportam como vírus.” Ora, ele poderia explicar isso aos defensores do chamado “tratamento precoce”, uma falácia criminosa disseminada todo dia por Bolsonaro e que tem o endosso do CFM (Conselho Federal de Medicina).
Orgulhoso da própria falta de inteligência, Terra expôs na CPI o que é bolsonarismo e quão prejudicial ele tem sido para a saúde dos brasileiros.
Por volta do meio-dia, Renan Calheiros exibiu o vídeo de setembro passado com a reunião do gabinete paralelo. Nele, Bolsonaro apontava que Terra seria uma espécie de “líder” do conselho negacionista. Terra disse não ter conhecimento da existência de gabinete paralelo, afirmou que se tratou de apenas uma reunião com Bolsonaro e minimizou a sua influência junto ao presidente.