‘Sócio oculto’, amigo de Barros e dono de TV: CPI ouve Marcos Tolentino 

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A CPI da Covid ouve hoje o advogado e dono da Rede Brasil de Televisão, Marcos Tolentino, apontado na comissão como “sócio oculto” do FIB Bank. A empresa é responsável por oferecer uma garantia considerada irregular por senadores do colegiado no negócio de compra da vacina indiana Covaxin. 

O depoimento de Tolentino é um dos mais aguardados pela cúpula da Comissão Parlamentar de Inquérito, que espera pressionar a testemunha a elucidar detalhes de sua eventual participação no FIB Bank e do seu relacionamento com o líder do governo na Câmara, deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), de quem é amigo próximo. O deputado, que integra a lista de investigados do colegiado, nega ter cometido qualquer irregularidade. 

Ontem à noite, a ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia autorizou Tolentino a ficar em silêncio durante o seu depoimento no Senado. Segundo a magistrada, o depoente tem o direito de não produzir prova contra si mesmo, mas é obrigado a responder perguntas não consideradas incriminatórias e pode ser acompanhado por um advogado. 

Também ontem, o relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que Barros é comandante de um “dos maiores esquemas de roubalheiras” e merece ser “exemplarmente punido”. 

Amizade com Ricardo Barros

Em depoimento à CPI, Barros reafirmou a proximidade com o advogado. “Tolentino é um amigo meu pessoal, dono da Rede Brasil Televisão. Eu tenho rádio há 40 anos e sempre nos encontramos nos eventos de radiodifusão em todo o Brasil.” 

A CPI apura se o líder governista agiu em favor de terceiros para levar o Ministério da Saúde a negociar as vacinas Covaxin com a Precisa Medicamentos, empresa envolvida em suspeitas anteriores relacionadas a contratos com a pasta, e Convidecia com a farmacêutica Belcher, com sede em Maringá, cidade natal e reduto eleitoral de Barros. 

Renan disse que Tolentino, “por ser amigo de Ricardo Barros, teria facilitado a emissão da carta fiança em favor da Precisa Medicamentos para satisfazer os interesses do deputado na execução do contrato da Covaxin”. 

A garantia fidejussória emitida pelo FIB Bank — R$ 80 milhões, o equivalente a 5% do total da operação de R$ 1,6 bilhão de compra das vacinas —, segundo senadores da CPI, não está de acordo com o modelo previsto no contrato com o governo federal. 

Segundo o vice-presidente da CPI e autor do requerimento de convocação de Tolentino, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), era preciso apresentar uma fiança bancária, um seguro-garantia ou uma caução em dinheiro ou títulos da dívida pública. 

A comissão ainda não divulgou elementos e/ou informações que corroborem as acusações contra Barros, mas Renan tem afirmado que as provas constarão do relatório que ele promete entregar até o fim de setembro. Em relação a esse tema, o depoimento de Tolentino é considerado fundamental. 

Suposto ‘sócio oculto’ de empresa

Senadores de oposição e independentes na comissão acreditam que Marcos Tolentino seja um dos verdadeiros sócios do FIB Bank, que deu a garantia para a Precisa Medicamentos seguir na negociação com o Ministério da Saúde para a venda da vacina Covaxin.

O diretor-presidente do FIB Bank, Roberto Pereira Ramos Júnior, em depoimento aos senadores em 25 de agosto, negou que Tolentino faça parte da empresa ou tenha alguma gerência sobre ela. No entanto, os senadores apontaram para uma série de pontos que consideram evidências de que Ramos Júnior é um “laranja” de Tolentino. 

Segundo Ramos Júnior, Tolentino é advogado de Ricardo Benetti e procurador de uma das empresas sócias do FIB Bank, a Pico do Juazeiro, com sede no Paraná. Ao longo do depoimento, Júnior buscou ressaltar que a procuração dada a Tolentino é para representar Benetti e a Pico, não o FIB Bank. 

Contudo, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) destacou que o “telefone informado como sendo do FIB Bank Garantia de Fianças Fidejussórias S.A. também seria o do escritório Benetti & Associados Gestão Tributária e Empresarial, que tem Marcos Tolentino da Silva como membro do conselho do escritório”. 

A MB Guassu é a outra empresa que compõe o capital social do FIB Bank —estimado por Ramos Júnior em R$ 7,5 bilhões e composto basicamente por dois imóveis, o que causou espanto e incredulidade entre os senadores. 

O endereço da firma é o mesmo do escritório de advocacia registrado em nome de Tolentino. O detalhe foi ressaltado por Randolfe Rodrigues durante o depoimento do diretor-presidente do FIB Bank. 

Ainda segundo Renan Calheiros, a empresa Brasil Space Air Log Conservação Aérea, em nome da mãe de Tolentino, recebeu R$ 1,9 milhão do FIB Bank. O valor foi repassado por meio de 19 transferências bancárias entre 4 de junho de 2020 e 12 de maio de 2021, informou o senador Humberto Costa (PT-PE).

Ramos Júnior não soube explicar o motivo exato das transferências e disse ser “possivelmente contratos que tenhamos entre essas duas empresas”.

Humberto Costa também afirmou que Tolentino tem um email institucional do FIB Bank. “Eu insisto, eu acho que vossa senhoria deveria dizer quem é o dono desse banco, quem é que manda mesmo nesse banco. Para mim, é esse senhor. Tolentino. Para mim, é o dono do banco, quem tem essas relações todas, e infelizmente ele não aparece”, disse a Ramos Júnior. 

A cúpula da CPI da Covid diz ainda ter outras informações referentes às atividades do FIB Bank, obtidas por meio de quebras de sigilos e apurações internas, que ainda não se tornaram públicas. 

Tolentino nega irregularidades 

Em posicionamento enviado à imprensa anteriormente, Tolentino negou ter atuação junto à gestão do FIB Bank e negou ter cometido qualquer ilegalidade. 

Em seu perfil da rede social LinkedIn, Marcos Tolentino se apresenta como “advogado tributarista, administrador e dono da Rede Brasil de Televisão”. Ele é presidente da rede de TV desde abril de 2007, diz.

Ainda, afirma ser “empresário à frente de um grupo que possui diversas atividades, desde assessoria empresarial e tributária à construção civil”. 

No depoimento do diretor-presidente do FIB Bank, Renan Calheiros afirmou que, segundo um advogado que tem colaborado com a comissão, o empresário do Medalhão Persa, Masoud Jafari, “compra espaço de televisão [na rede] de Tolentino” e “é acusado de lavar dinheiro para Ricardo Barros”. Jafari tem o Paraná como uma de suas principais bases. 

Ramos Júnior disse não saber de quem se trata. 

Segundo a agenda oficial do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), na manhã de 11 de março deste ano, Ricardo Barros, Masoud Jafari, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, o deputado federal Roman (Patriota-PR), o funcionário da Casa Civil, Thiago Meirelles Fernandes Pereira, e o consultor internacional Salehri Farshad tiveram uma reunião com o mandatário da República no Palácio do Planalto. O assunto tratado não está descrito no portal da Presidência. 

Suposto uso de garantias do FIB Bank 

Em aba na seção de “perguntas frequentes” no portal do FIB Bank sobre onde as garantias fidejussórias da empresa já foram utilizadas constam o Ministério da Fazenda —atual Economia— e a AGU (Advocacia-Geral da União), entre outros entes públicos de níveis estadual e municipal. 

A questão foi levantada pelo senador Rogério Carvalho na CPI, em tom de indignação. “Todas essas instituições já foram de alguma forma garantidas pelo ‘lorota banco’.” 

Procurada, a AGU informou não possuir qualquer relação de negócio ou contrato com o FIB Bank. Ainda, não constar que alguma garantia fidejussória apresentada pelo FIB Bank tenha sido aceita pela AGU. 

O órgão disse que, “ocasionalmente, garantias oferecidas pela entidade [FIB Bank] podem ter sido aceitas por magistrados nos processos em que a AGU seja parte”, mas que “não foi possível localizar essa informação”.

O Ministério da Economia não se manifestou. 

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