Ministério da Saúde inicia consulta pública sobre vacinação de crianças

Até 08h10 desta quinta (23), informações do processo ainda não estavam no site da pasta; população poderá contribuir até dia 2 de janeiro, e decisão do governo deve ser anunciada no dia 5

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A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou o uso da vacina da Pfizer contra a Covid-19 em crianças de 5 a 11 anos de idade no Brasil no dia 16 de dezembro. A decisão foi divulgada após realização de uma avaliação técnica do pedido submetido pela farmacêutica no dia 12 de novembro.

No entanto, a chegada do imunizante aos postos de saúde depende do calendário e da logística do Programa Nacional de Imunizações (PNI), do Ministério da Saúde, responsável pela coordenação da distribuição das vacinas no Brasil.

Num movimento incomum, para definir a inclusão da faixa etária na campanha de imunização, o Ministério da Saúde realiza, a partir desta quinta-feira (23), uma consulta pública que ficará disponível até o dia 2 de janeiro de 2022.

As contribuições devem ser enviadas online, pelo site do Ministério da Saúde. Na página, deve estar disponível a documentação relativa à consulta pública, conforme publicado no Diário Oficial da União na quarta-feira (22).

Porém, até às 08h10 desta quinta (23), as informação sobre a consulta pública ainda não estavam disponíveis no site da pasta.

Após o encerramento da consulta, as contribuições apresentadas serão alvo de uma audiência pública prevista para o dia 4 de janeiro. No dia seguinte, o ministério deverá anunciará a decisão.

Decisão técnica

A vacina para esta faixa etária conta com dosagem e formulação diferentes do imunizante aplicado em maiores de 12 anos. De acordo com a Pfizer, os frascos são diferenciados pela cor, sendo roxa para adultos e adolescentes e laranja para crianças.

A aprovação da Anvisa permite que a Pfizer comercialize, distribua e disponibilize a vacina para uso no país para a nova faixa etária.

Na quarta-feira (22), a Anvisa enviou ao Ministério da Saúde a íntegra do processo do comunicado público de aprovação da vacina para o público infantil, que contém as referências científicas utilizadas para embasar a decisão. O ofício foi disponibilizado pela agência.

A agência também tornou públicos dois documentos sobre o processo, o parecer público de avaliação de medicamentos (PPAM) e o Parecer Técnico PGR (plano de gerenciamento de riscos).

Ainda assim, o ministério decidiu submeter a decisão a essa consulta pública. O detalhamento das ações foi explicado pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, em uma entrevista à imprensa realizada no sábado (18), com a participação do Advogado-Geral da União, Bruno Bianco.

Na ocasião, Queiroga afirmou que a avaliação da Anvisa tem como foco verificar as questões relativas à segurança e à eficácia do imunizante no contexto estudado e apresentado pela indústria farmacêutica.

Em um comunicado da pasta, o ministro afirmou, no entanto, que a autorização pela Anvisa não implica em incorporação automática da vacina ao PNI.

“São avaliações distintas. Na Anvisa é o ingresso para entrar na perspectiva de validação. A decisão final compete ao Ministério da Saúde e nós tomamos as decisões de maneira tempestiva e vamos avaliar a decisão da agência em suas minúcias”, disse.

Definição de consulta pública pelo Ministério da Saúde

O Ministério da Saúde define que consultas públicas visam “promover o diálogo entre a administração pública e o cidadão, em cumprimento aos Princípios da Legalidade, Moralidade, Eficiência, Publicidade, Transparência e Motivação”.

Segundo a pasta, a consulta é definida como um mecanismo de participação social, de caráter consultivo, realizado com prazo definido e aberto a qualquer interessado, com o objetivo de receber contribuições sobre determinado assunto.

A prática, de acordo com o ministério, incentiva a participação da sociedade na tomada de decisões relativas à formulação e definição de políticas públicas.

O sanitarista Gonzalo Vecina, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) e ex-diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), explica que as consultas públicas são instrumentos importantes para a definição de políticas públicas.

No entanto, na opinião do pesquisador, a consulta pública deve ser utilizada diante de contextos que envolvam controvérsias. Para ele, a realização no cenário da vacinação é uma medida desnecessária.

“Esse tipo de instrumento é muito importante para tomar decisões em contextos de controvérsias. Não existe uso de consulta pública para tomar uma decisão que não tem nenhuma controvérsia. Decisão sobre vacinar ou não vacinar não passa por consulta pública, mas pela opinião de técnicos”, afirmou Vecina.

O pesquisador avalia que, diante de um cenário em que o Ministério da Saúde possa se opor à vacinação da faixa etária de 5 a 11 anos contra a Covid-19, a pasta terá que embasar a argumentação a ser apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Na segunda-feira (20), o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, atendeu a um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) e ampliou o prazo para que o governo federal forneça um plano para a imunização das crianças até o dia 5 de janeiro.

“No dia 5 de janeiro, o Ministério da Saúde terá que colocar sua opinião pra o Supremo Tribunal Federal, que irá tomar sua decisão final. Se o ministério disser não à vacinação, terá que substanciar esse posicionamento e sabemos que não há substância para dizer não”, disse o sanitarista.

Aprovações nos Estados Unidos e Europa

A Food and Drug Administration (FDA), órgão semelhante à Anvisa nos Estados Unidos, aprovou o uso da vacina da Pfizer para crianças de 5 a 11 anos no dia 29 de outubro. Segundo a FDA, a decisão foi tomada a partir da análise de dados de um comitê de especialistas independente sobre a segurança e eficácia do neste público.

Os testes mostraram uma eficácia no público infantil de 90,7%, semelhante à encontrada na faixa de 16 a 25 anos. O estudo, que analisou 3,1 mil crianças nessa faixa etária que receberam doses da vacina da Pfizer, não identificou efeitos colaterais graves.

A Academia Americana de Pediatria (AAP) recomenda a vacinação contra a Covid-19 para todas as crianças e adolescentes com 5 anos de idade ou mais que não tenham contraindicações.

Até o dia 15 de dezembro, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, registraram que 5,6 milhões de crianças nos país, com idades entre 5 e 11 anos, receberam pelo menos uma dose da vacina. O índice representa 20% dessa população nos Estados Unidos.

A Agência Europeia de Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) também aprovou o uso do imunizante contra a Covid-19 em crianças. A decisão foi divulgada no dia 25 de novembro.

“Os efeitos adversos mais frequentes em crianças dos 5 aos 11 anos são semelhantes aos das pessoas com 12 anos ou mais. Incluem dor no local da injeção, cansaço, dor de cabeça, vermelhidão e inchaço no local da injeção, dores musculares e calafrios. Esses efeitos são geralmente leves ou moderados e melhoram alguns dias após a vacinação”, diz o comunicado da agência europeia.

Especialistas em saúde pública reforçaram necessidade de vacinação de crianças

Para esclarecer as principais dúvidas sobre a vacinação contra a Covid-19 de crianças de 5 a 11 anos no país, a CNN entrevistou os médicos Esper Kallás, Ludhmila Hajjar e Roberto Kalil Filho.

Os especialistas foram unânimes ao indicar que a imunização desta faixa etária contra a doença deve ser iniciada o quanto antes.

“Estamos diante de um cenário que já temos estudos científicos suficientes para demonstrar segurança e eficácia de vacinar a população pediátrica. Já temos o parecer da Anvisa e penso que agora estamos diante apenas da operacionalização disso para as próximas semanas e meses”, afirmou a cardiologista Ludhmila Hajjar, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e chefe da UTI de Covid-19 do Hospital das Clínicas.

O cardiologista Roberto Kalil Filho, apresentador do programa CNN Sinais Vitais e professor da Faculdade de Medicina da USP, ressaltou que a estrutura capilarizada do Sistema Único de Saúde (SUS) no país vai permitir a vacinação acelerada da população infantil.

“É necessário agilizar a vacinação em crianças e adultos. Lembramos que a população toda não está vacinada ainda. O sistema de vacinação do Brasil é um dos melhores do mundo, é um sistema capilarizado. Desde que você tenha as vacinas, como nós temos, facilmente a população é vacinada”, afirmou Kalil.

Para o cardiologista, a aprovação da Anvisa é o subsídio necessário para a imunização de crianças de 5 a 11 anos que, segundo ele, deve ser iniciada o quanto antes. “A vacinação não tem que ter atraso. A ciência está aí, tem que vacinar. Qualquer burocratização em torno desse tema pode levar a consequências sérias”, disse.

Embate e ameaças

Desde outubro, a Anvisa foi alvo de ameaças por parte de pessoas contrárias à vacinação de crianças contra a Covid-19.

A Procuradoria da República no Distrito Federal denunciou à Justiça Federal o homem acusado de enviar ameaças, em outubro, a diretores da agência.

De acordo com informações do analista de política da CNN, Caio Junqueira, a Anvisa recebeu mais de 130 e-mails com ameaças a seus servidores em razão da autorização para vacinação infantil.

Entre as mensagens, estão e-mails que citam “último aviso” a servidores e falam em “mão sujas de sangue” dos técnicos.

Em entrevista à CNN, o gerente-geral da Anvisa, Gustavo Mendes, repudiou os ataques feitos a técnicos da agência após a aprovação da vacinação contra a Covid-19 no público infantil, e reforçou a rigidez e seriedade da avaliação dos imunizantes feita pela equipe.

“Nosso trabalho é técnico e estamos muito seguros da nossa decisão; todos os dados foram amplamente discutidos”, afirmou Mendes.

Na sexta-feira (17), a Anvisa publicou uma nota em resposta às declarações do presidente Jair Bolsonaro em live realizada na quinta-feira (16).

Na transmissão ao vivo, Bolsonaro disse que pediu o nome dos integrantes da agência que aprovaram a autorização do uso da vacina da Pfizer em crianças de 5 a 11 anos no Brasil, para que sejam divulgados.

“A Anvisa não está subordinada a mim, vamos deixar bem claro isso, não interfiro lá, mas pedi extraoficialmente o nome de quem autorizou a vacina para crianças a partir de cinco anos. Queremos divulgar o nome dessas pessoas para que todo mundo tome conhecimento de quem são e forme seu juízo”, disse o presidente.

Em resposta, a Anvisa informou que “seu ambiente de trabalho é isento de pressões internas e avesso a pressões externas”.

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