Mega foto do Sol mostra forma humana? Entenda o que está por trás da imagem e o que revela a ciência

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O que a imagem mais detalhada do Sol já registrada revela? Um zoom em um dos pontos dessa foto composta por um mega mosaico de imagens mostra formas que se assemelham a um homem de costas, olhando para a esquerda.

Por mais que nossos olhos tendam a encontrar figuras humanas em todos os cantos, a ciência explica que por trás das traços amarelos e dourados há, na verdade, conceitos como gás, plasma, arcos magnéticos e tempestades geomagnéticas capazes de interferir na vida na Terra.

Parece complicado, mas são fenômenos que estão sob alguma das camadas da mega foto e eles não ditam apenas a dinâmica da nossa estrela de 4,5 bilhões de anos. O Sol e seus fenômenos podem afetar desde o funcionamento de sistemas de Internet e GPS aqui na Terra até a segurança de astronautas em missões espaciais. E tudo está ali, revelado ou sob outras áreas que a foto não alcançou.

O que a imagem mostra de fato?

A foto, um conjunto de 25 imagens individuais, foi feita pelo telescópio espacial de alta resolução acoplado à sonda, lançada em 2020 pela Nasa juntamente com a Agência Espacial Europeia, a ESA.

Na imagem, além de ser possível enxergar uma figura humana intrigante (um fenômeno que a psicologia chama de pareidolia – o reconhecimento de uma imagem, som ou objeto familiar em um estímulo aleatório, como enxergar formas de animais em nuvens), o que temos em destaque é a última camada da atmosfera do Sol, a coroa solar, que é bem mais quente que superfície da estrela.

Sim, assim como a Terra, o Sol possui uma atmosfera. E ela é dividida em duas partes, a cromosfera, a camada mais inferior, e a coroa (a que de fato vemos nas imagens).

As regiões mais luminosas da foto são chamadas de manchas solares ou regiões ativas, locais de alta concentração de campo magnético. Isso quer dizer que, diferentemente do que imaginamos quando olhamos para o espaço, o Sol não é uma bola estática.

Os campos magnéticos estão a todo tempo produzindo uma “dança” de gás e plasma, o material que forma a estrela.

“O Sol é uma estrela muito ativa. Ele tem períodos em que essas regiões ativas aparecem em maior número (que chamamos de máximo solar) e outros em que elas quase não aparecem”, diz Alessandra Abe Pacini, cientista do grupo de Física Espacial do CIRES/NOAA, na Universidade do Colorado.

O que intriga os cientistas por muito tempo é o fato de que a dinâmica de aquecimento dessas regiões é algo único.

Diferentemente do esperado, a camada mais exterior da nossa estrela (a coroa vista na foto da ESA) é mais quente que sua superfície. São temperaturas que ali chegam à casa do milhão, enquanto a superfície solar chega a “apenas” 5 mil graus Celsius.

Adriana Valio, astrônoma do Centro de Rádio Astronomia e Astrofísica Mackenzie, explica que isso é curioso porque aqui na Terra, quando pensamos numa fogueira, por exemplo, as regiões mais quentes que ardem em chamas ficam justamente nas camadas mais inferiores, o inverso da dinâmica do Sol.

“Isso eu acho bárbaro”, diz. “É uma questão que intriga há mais de 30 anos e que a sonda poderá resolver”.

O Sol visto pelo Solar Orbiter em luz ultravioleta extrema a uma distância de aproximadamente 75 milhões de quilômetros. — Foto: ESA & NASA/Solar Orbiter/EUI; Processamento de dados: E. Kraaikamp (ROB)

A ‘tomografia’ da atmosfera solar

A ESA também divulgou imagens que mostram a cromosfera do Sol. São quatro imagens ‘coloridas’ que revelam detalhes sobre essa camada da atmosfera que não é visível aqui da Terra.

Adriana Valio explica que a sonda tem dois grupos de instrumentos: câmeras imageadoras, que tiram as fotos em alta resolução do começo desta reportagem, e ferramentas que fazem uma espécie de “tomografia” do Sol, medindo a densidade de partículas da estrela e do vento solar.

Na Solar Orbiter, esse “tomógrafo” é um instrumento chamado de SPICE. A função dele é entender como o Sol cria e controla a heliosfera, a região do espaço onde o nosso sol exerce sua influência.

“O Sol tem um fluxo continuo de partículas. Esse fluxo preenche todo o Sistema Solar”, explica Valio. ” E a Solar Orbiter conseguiu mapear, pela primeira vez, de onde sai esse vento solar “.
Cores mostram diferentes pontos da atmosfera do Sol. — Foto: ESA & NASA/Solar Orbiter/SPICE team; Data processing: G. Pelouze (IAS)

Por que mapear de onde sai esse vento solar?

As 4 regiões mais brilhantes e esbranquiçadas ao centro das imagens da figura acima mostram áreas mais ativas do nosso Sol. É justamente nelas onde há maior concentração de campo magnético.

Um exemplo de região ativa capturada pela sonda da ESA é a imagem do topo desse matéria, que se assemelha à figura de um homem “saindo” do Sol. Nela podemos ver arcos magnéticos, partículas super energéticas em forma de espiral.

Pacini explica que essas regiões ativas podem eventualmente explodir. Elas têm altíssimas temperaturas, mas ainda não são chamadas de erupções solares. Elas têm cerca de 400 mil a 1 milhão de graus Celsius. Se, de fato, explodirem, chegam a dezenas de milhões de graus.

Um dos objetivos da Solar Orbiter é justamente entender melhor a atividade do Sol e como esse campo magnético solar funciona. Mostrar como e de onde partem os ventos solares.

“É com essa atividade magnética que ocorrem as explosões solares e as ejeções de massa, quando bilhões de toneladas de matéria são lançadas para o meio interplanetário e podem até atingir a Terra”, ressalta Adriana Valio.

Entender esses processos será fundamental para descobrir como essas explosões solares surgem e como isso influencia o nosso clima espacial.

Satélites europeus do programa Galileo devem ser lançados no 2º semestre para concorrer com sistema GPS — Foto: ESA/P. Carril/Divulgação

Isso é importante porque não é somente a aurora boreal que é provocada pelos efeitos da atividade solar. Sinais de Internet, o GPS e até a transmissão de energia elétrica podem ser impactados por essas tempestades geomagnéticas, daí a importância de prevermos esses eventos.

“A gente tem também doses letais de radiação solar. Se tivermos algum astronauta desprotegido enquanto faz uma missão fora da Estação Espacial Internacional, por exemplo, isso é um problema”, diz a astrônoma.

A professora ainda explica que, no passado, diversos satélites de bilhões de dólares eram perdidos por causa desse problema. Hoje em dia, a principal preocupação é com os sistemas de GPS.

“Os GPS utilizam satélites. Hoje os aviões todos pousam e decolam automaticamente por conta dessa tecnologia. Então isso pode ser realmente um problema grave”, alerta a pesquisadora.

Segundo a Nasa, a tempestade geomagnética mais forte já registrada foi o chamado Evento Carrington, que levou o nome astrônomo britânico Richard Carrington. Foi ele quem observou a erupção solar de 1º de setembro de 1859 que desencadeou o evento.

Na época, os sistemas de telégrafo do mundo todo apresentaram problemas e seus operadores chegaram a levar descargas elétricas.

O evento foi tão atípico que auroras boreais puderem ser vistas em países da América Central, como Cuba, Bahamas, Jamaica, El Salvador.

“Tudo o que acontece no Sol vai perturbar o ambiente da Terra. Hoje a nossa sociedade depende fortemente de tecnologia espacial e tudo isso depende, por sua vez, do clima espacial”, lembra a astrônoma Alessandra Pacini.

“A importância de entendermos a origem dessas explosões solares é realmente a capacidade de a prevermos. Temos que saber quando elas vão acontecer para que consigamos nos proteger”.
Comparação ilustrativa mostra a enorme diferença do tamanho entre o Sol e a Terra. Os cientistas calculam que mais de 1 milhão de planetas Terra poderiam ocupar o volume da estrela. — Foto: ESA & NASA/Solar Orbiter/EUI; Processamento de dados: E. Kraaikamp (ROB)

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