“Acho que é uma gestão de risco sensata pensar nos piores cenários possíveis. Se fazemos isso em todas as outras situações, definitivamente devemos fazer quando se trata do destino do planeta e das espécies”, diz Luke Kemp, principal autor do estudo, da Universidade de Cambridge.
Usando modelos climáticos, o relatório mostra que — nesse tipo de cenário — em 2070 cerca de 2 bilhões de pessoas vivendo em algumas das áreas politicamente mais frágeis do mundo estariam enfrentando temperaturas médias anuais de 29°C.
“Temperaturas médias anuais de 29°C afetam atualmente cerca de 30 milhões de pessoas no Saara e na Costa do Golfo”, diz o coautor do estudo, Chi Xu, da Universidade de Nanjing.
“Até 2070, essas temperaturas e as consequências sociais e políticas afetarão diretamente duas potências nucleares e sete laboratórios de contenção máxima que abrigam os patógenos mais perigosos. Há um sério potencial para efeitos desastrosos em cadeia”, disse ele.
O relatório diz que as altas temperaturas não são o único problema. Há também os efeitos indiretos, como crises alimentares e financeiras, conflitos e surtos de doenças.
Os cientistas dizem que deve haver mais atenção na identificação de possíveis pontos de inflexão, onde o aumento do calor desencadeia outro evento natural que aumenta ainda mais as temperaturas — como as emissões de metano do derretimento do permafrost ou das florestas que começam a emitir carbono em vez de absorvê-lo.
Para avaliar adequadamente todos esses riscos, os autores estão solicitando ao Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas que realize um relatório especial sobre mudanças climáticas catastróficas.
Os pesquisadores disseram que estudar a fundo as consequências dos piores cenários é fundamental, mesmo que isso possa assustar as pessoas.
Eles dizem que uma pesquisa assim permitiria aos cientistas considerar alternativas de emergência, como engenharia climática, que podem envolver o bombeamento de gases refrigerantes na atmosfera. Os pesquisadores seriam capazes de realizar uma análise de risco para essas intervenções drásticas. Focar nos piores cenários também pode ajudar a educar as pessoas — e pode até reduzir as probabilidades de alguns desses cenários virarem realidade.
“Entender esses cenários plausíveis, mas sombrios, é algo que pode angariar apoio junto à opinião política e civil”, diz Kemp.
“Vimos isso quando se identificou a ideia de um inverno nuclear que ajudou a impulsionar muitos esforços públicos, bem como o movimento de desarmamento ao longo dos anos 1970 e 1980.”
“E espero que, se pudermos encontrar mecanismos concretos e claros semelhantes quando se trata de pensar sobre as mudanças climáticas, também tenha um efeito semelhante”.
O apelo por um estudo profundo de cenários mais extremos vai agradar a muitos ativistas climáticos mais jovens, que dizem que o tema não é abordado porque poderia assustar as pessoas e levá-las à inação.
“É vital que tenhamos pesquisas em todas as áreas das mudanças climáticas, incluindo a assustadora realidade de eventos catastróficos”, diz Laura Young, ativista climática, de 25 anos de idade.
“Isso ocorre porque sem toda a verdade e todos os impactos potenciais, não faremos as escolhas informadas de que precisamos e não estaremos conduzindo a ação climática com pressão suficiente.”
O estudo foi publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences.
A repórter de clima e ciências da BBC News, Ella Hambly, colaborou.