Cratera no fundo do oceano pode ter sido causada por “irmão” de asteroide que matou os dinossauros

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Notoriamente menos explorado do que a superfície de Marte, o fundo do oceano da Terra esconde verdadeiros tesouros. E não nos referimos a baús naufragados repletos de joias nem à rica biodiversidade marinha. O assunto, desta vez, é uma imensa cratera de impacto que teria sido provocada por um asteroide há 66 milhões de anos – na época da extinção dos dinossauros.

Sim, curiosamente, a cratera “Nadir”, batizada em homenagem ao vulcão vizinho Nadir Seamount, tem a mesma idade do impacto Chicxulub, causado pela rocha espacial que acabou com 75% da vida no planeta no período Cretáceo. 

Mapa oceânico mostra localização da cratera Nadir. Créditos: Uisdean Nicholson et. al

Publicada sexta-feira (11) na revista Science Advances, a descoberta levanta uma questão: esta cratera teria alguma relação com o asteroide Chicxulub? 

Um artigo escrito pelos autores do estudo para o site The Conversation explica que a cratera foi identificada como parte de um projeto mais amplo para reconstruir a separação tectônica da América do Sul da África no período Cretáceo.

Eles usaram a “reflexão sísmica”, uma técnica que funciona de maneira semelhante aos dados de ultrassom, enviando ondas de pressão através do oceano e detectando a energia que é refletida de volta. Esses dados permitem que geofísicos e geólogos reconstruam a arquitetura das rochas e sedimentos.

“Percorrendo esses dados no final de 2020, nos deparamos com um recurso altamente incomum”, relata Uisdean Nicholson, professor associado de geociência na Universidade Heriot-Watt, no Reino Unido, e principal autor do estudo. 

Segundo Nicholson, entre os sedimentos planos e em camadas do Planalto da Guiné, a oeste da África, foi identificado um vão com um pouco menos de 10 km de largura e centenas de metros de profundidade.

“Muitas de suas características são consistentes com uma origem de impacto, incluindo a escala da cratera, a proporção de altura para largura e a altura da borda”, explicou Sean Gulick, pesquisador de geociências na Universidade do Texas-Austin, nos EUA. Ele estuda interações tectônico-climáticas, o papel do catastrofismo no registro geológico e imagens geofísicas marinhas e planetárias. “A presença de depósitos caóticos fora do chão da cratera também se assemelha à ‘ejecta’, como é chamado o fenômeno de lançamento de partículas da cratera imediatamente após uma colisão”.

Também foram considerados outros processos que poderiam ter formado a cratera, como o colapso de um vulcão submarino ou de um pilar de sal abaixo do fundo do mar. Uma liberação explosiva de gás abaixo da superfície também pode ser uma causa. Nenhuma dessas possibilidades, no entanto, é consistente com a geologia local ou a geometria da cratera.

“Depois de identificar e caracterizar a cratera, construímos modelos computacionais de um evento de impacto para ver se poderíamos replicar a cratera para caracterizar o asteroide e seu impacto”, disse a coautora Veronica Bray, pesquisadora do Laboratório Lunar e Planetário da Universidade do Arizona, nos EUA. 

Segundo os cientistas, a simulação que melhor se encaixa na forma da cratera é para um asteroide de 400 metros de diâmetro atingindo um oceano que tinha 800 m de profundidade. 

Um asteroide de cerca de 400 m de diâmetro atingiu um oceano de 800 m de profundidade onde hoje é o oeste da África, na mesma época da extinção dos dinossauros, abrindo uma cratera submersa de 10 km de largura. Imagem: Aunt Spray – Shutterstock

Isso resultaria em uma coluna de água de mais de 790 m de espessura, com o asteroide e um volume substancial de sedimentos sendo instantaneamente vaporizados, formando uma grande bola de fogo visível a centenas de quilômetros de distância.

O estudo diz que as ondas de choque do impacto seriam equivalentes a um terremoto de magnitude 6,5 ou 7, o que provavelmente provocaria deslizamentos de terra subaquáticos ao redor da região. “Um trem de ondas de tsunami se formaria. A explosão de ar seria maior do que qualquer coisa ouvida na Terra na história registrada”. 

Segundo Nicholson, a energia liberada seria aproximadamente mil vezes maior do que a da erupção do vulcão Hunga, ocorrida em janeiro deste ano em Tonga. “Também é possível que as ondas de pressão na atmosfera da Terra amplificassem ainda mais as ondas do tsunami longe da cratera”.

Por que o asteroide causador desta cratera pode ser “irmão” de Chicxulub?

Existem três teorias quanto a essa possível relação. A primeira é que ambos os asteroides podem ter se formado a partir da quebra de uma mesma rocha mãe, com o fragmento maior resultando no evento de Chicxulub e um fragmento menor formando a cratera Nadir. 

O evento de ruptura também poderia ter se formado por uma quase colisão anterior, quando o asteroide passou perto o suficiente da Terra a ponto de experimentar forças gravitacionais fortes o suficiente para fragmentá-lo. A colisão real poderia então ter ocorrido em uma órbita subsequente. Embora isso seja menos provável, esse caso é exatamente como o que aconteceu com o cometa Shoemaker-Levy 9 em 1994, quando vários de seus pedaços colidiram com Júpiter ao longo de vários dias após o choque principal.

Outra possibilidade é que o asteroide causador da cratera Nadir tenha feito parte de um “aglomerado de impacto” de vida mais longa, formado por uma colisão no cinturão de asteroides no início da história do Sistema Solar. Essa é conhecida como a hipótese do “primo pequeno”.

De acordo com essa visão, a colisão pode ter enviado uma chuva de asteroides para o Sistema Solar interior, que pode ter se chocado com a Terra e outros planetas durante um período de tempo mais prolongado, talvez um milhão de anos ou mais. 

E se tudo não passar de uma simples coincidência?

Isso tudo pode ser também apenas uma coincidência. “Esperamos uma colisão de um asteroide do tamanho de Nadir a cada 700 mil anos ou mais”, diz o artigo que descreve a pesquisa. “Por enquanto, no entanto, não podemos afirmar definitivamente que a cratera Nadir foi formada por um impacto de asteroide até recuperarmos amostras físicas do chão da cratera e identificarmos minerais que só podem ser formados por pressões extremas de choque”. 

Para esse fim, os autores encaminharam, recentemente, uma solicitação para perfurar a cratera por meio do Programa Internacional de Descoberta do Oceano (IODP, na sigla em inglês), uma colaboração internacional de pesquisa marinha que explora a história e a dinâmica da Terra.

“Tal como acontece com a hipótese da cratera de impacto principal, só podemos testar as hipóteses da irmã caçula e do primo pequeno datando com precisão a cratera usando essas amostras, bem como procurando outras crateras candidatas de idade semelhante”, explica Nicholson.