Rondônia é o 2º estado do país com os maiores índices de práticas racistas do Brasil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. O número de denúncias do crime aumentou 41% em um ano, enquanto os de injúria racial cresceram 9%.
Por trás do número há rostos, como o de Mateus Ferreira, de 26 anos. O jovem mora em Porto Velho e revelou ao g1 que a vida de uma vítima de racismo é desafiadora e, muitas, vezes esmagadora.
O jovem contou que houve uma situação que o perturbou: ao entrar em uma loja, começou a ser seguido por uma vendedora. A mulher o questionou se ele tinha a intenção de fazer uma compra ou se planejava “roubar” algo.
Ele conta que, ao mesmo tempo, um jovem branco entrou no estabelecimento e não foi abordado da mesma forma. De modo contrário, a vendedora o tratou com educação, perguntando se ele precisava de ajuda. Naquele momento, Mateus percebeu que sua cor o colocava em uma posição inferior na sociedade.
Aumentos dos casos de racismo e injúria
De acordo com o Anuário de Segurança, o estado de Rondônia registou 92 denúncias de racismo em 2022, número que ultrapassa a quantidade de ocorrências do ano anterior, quando foram feitas 65 denúncias.
Se a comparação for com outros estados, Rondônia é o segundo com a maior taxa de casos de racismo, atrás somente do Rio Grande do Sul.
Os dados apontam ainda que houve um aumento gradativo nos casos de práticas racistas nos últimos três anos. Veja os dados abaixo:
Segundo o Anuário, os registros de injúria racial também subiram. Em 2022, foram feitas 242 denúncias, em comparação com as 220 ocorrências em 2021, o que representa um aumento de 9%.
Embora o crescimento em termos percentuais seja menor, em números absolutos os casos de injúria racial superam os de racismo.
Qual a diferença entre injúria racial e racismo?
A injúria racial está relacionada a ofensas direcionadas a uma única pessoa com base em sua cor, com o objetivo de desqualificá-la. Já o racismo é uma prática que engloba a discriminação contra um grupo étnico e afeta uma coletividade.
De acordo com a professora e doutora Rosângela Hilário, o aumento dos casos está relacionado com a iniciativa das pessoas negras de denunciarem os crimes. Entretanto, a tendência é não diminuir, devido à ausência de políticas públicas, como a inclusão de educação sobre questões raciais nas escolas públicas.
O g1 procurou o Governo do Estado de Rondônia em busca de informações sobre a educação racial na rede de educação, mas não obteve resposta até a data da publicação desta matéria.
“O racismo é comum para as pessoas”
A cultura de racismo estrutural é abrangente e engloba diversas práticas, mas há algumas que se tornam mais comuns no país. O racismo religioso, por exemplo, envolve a desqualificação e o desrespeito às pessoas que praticam religiões de origem africana.
No mês de agosto deste ano, a mãe de uma menina de cinco anos procurou órgãos competentes para denunciar que a filha sofreu intolerância religiosa dentro de uma escola municipal, em Porto Velho, praticada por duas funcionárias da instituição.
De acordo com Rosângela Hilário, o racismo está também na linguagem, desde expressões sutis até discursos mais explícitos. Falas consideradas ‘comuns’ perpetuam estereótipos e discursos negativos relacionados às pessoas de pele negra.
Nas escolas, a discriminação pode ser evidenciada quando crianças negras são excluídas e alvo de piadas por seus colegas. No cotidiano, o racismo está em palavras, gestos e olhares julgadores, segundo a professora.
Vítimas da sociedade
De acordo com o psicólogo e professor Jairo Maia, o racismo está relacionado com a falta de aceitação que as pessoas possuem sobre os negros na sociedade, e isso acontece desde o surgimento do Brasil, quando houve a escravidão.
O fenômeno impacta diretamente as vítimas e pode comprometer o processo de autoaceitação e autoestima. Em casos mais graves de violência racista, as vítimas podem desenvolver comportamentos autodestrutivos, como automutilação, auto rejeição e, em situações extremas, até mesmo o suicídio.
Quem pode denunciar?
O racismo é um tipo de violência comum na sociedade, principalmente por ser praticado na frente de outras pessoas, de acordo com o defensor público e presidente do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial, Fábio Roberto.
Para acabar com este crime, é necessário uma não passividade de todo mundo que presencia algum ato racista, não apenas da vítima. Ou seja, além de não praticar o racismo é necessário ser antirracista, explica o defensor.
Por isso, ao ser vítima ou presenciar atos racistas e/ou de discriminação, é necessário realizar uma denuncia. Veja o passo a passo:
- Faça um boletim de ocorrência na delegacia mais próxima da sua residência, ou pela internet, para documentar o incidente ou disque 190 (Policia Militar);
- Acione o Ministério Público e a Defensoria Pública para obter acompanhamento judicial e até mesmo apoio psicológico;
- Busque apoio em rede de proteção, incluindo órgãos como o Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial e o Conselho Municipal de Porto Velho, que podem oferecer orientação e suporte específico, como em casos de discriminação racial.