Casal Escraviza Mulher por 30 Anos e é Condenado a Pagar Indenização

Condenação por escravidão: Casal dono de loja no Brás é punido após 30 anos de exploração de mulher.

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Casal condenado por escravidão no Brás: entenda o caso

São Paulo – O casal José Enildo Alves de Oliveira, de 60 anos, e Maria Sidronia Chaves de Oliveira, de 58, foi condenado por manter uma mulher em condição análoga à escravidão por 30 anos. Eles são proprietários de uma loja de tecidos no Brás, região central de São Paulo, conhecida pelo comércio popular. A vítima era explorada no estabelecimento e na residência do casal.

A pena foi de dois anos de prisão em regime aberto e multa de R$ 506 para cada um. Além disso, a reclusão pode ser substituída por prestações de serviços comunitários e pagamento de dois salários mínimos cada, totalizando R$ 6.072 a uma entidade beneficente. Assim, no total, o casal precisará desembolsar R$ 7.084.

A decisão foi proferida pelos desembargadores André Nekatschalow, Maurício Kato, Ali Mazloum e pela juíza Luciana Ortiz, da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). Em agosto de 2023, a juíza Paula Mantovani Avelino havia absolvido o casal. Contudo, o Ministério Público Federal (MPF) recorreu, levando o caso ao TRF-3.

Quem é o casal condenado por escravidão?

Segundo depoimentos, Maria Sidronia e José Enildo possuem a loja há cerca de 13 anos e moram em imóvel próprio. Além disso, tinham uma faxineira que trabalhava algumas vezes na semana por R$ 150 a diária e exploravam a vítima em sua casa.

O casal tem dois filhos, um deles residente em Manaus (AM) desde a abertura da loja. Os netos passavam férias na casa dos avós, muitas vezes sob os cuidados da vítima. Ela também teria cuidado dos filhos do casal quando eram pequenos.

Em seu depoimento, Maria Sidronia afirmou que a vítima “lhe ajudou a vida toda” e que, se tivesse condições financeiras, daria uma casa para ela. Além disso, a doação de um imóvel estava prevista em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), assinado com o Ministério Público do Trabalho (MPT) em 2014, mas o acordo nunca foi cumprido.

O casal procurou a Defensoria Pública da União (DPU) para fazer sua defesa e declarou hipossuficiência financeira para não arcar com os custos do processo. Entretanto, há dívidas ativas registradas no nome do casal no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e uma dívida de IPTU registrada no nome de Maria Sidronia em Pernambuco.

O que diz a vítima?

A vítima relatou ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que, por volta de outubro de 1991, foi recrutada por Maria Sidronia na Pastoral do Migrante, no bairro do Glicério, região central de São Paulo. O combinado era o pagamento de um salário mínimo mensal, mas isso não ocorreu.

Ela recebeu apenas o primeiro salário. No segundo mês, foi responsabilizada pelo conserto de uma máquina de lavar quebrada e nunca mais recebeu pagamentos. Em 2001, passou a trabalhar também na loja da patroa, sem remuneração.

Além disso, era obrigada a cobrar cheques sem fundos dos clientes da loja e chegou a passar uma semana em Goiânia (GO) fazendo cobranças. Como consequência, nunca tirou férias e não tinha documentos de identificação.

Como funcionava a escravidão?

Entre 1991 e 2022, a vítima viveu em uma edícula nos fundos da casa do casal, sem registro em carteira e sem pagamento de salário. Além disso, trabalhava de 7h às 22h, desempenhando serviços domésticos e ajudando na loja.

Ela sofreu tortura psicológica e agressões físicas. José Enildo frequentemente a xingava, chamando-a de “filha da puta”, “macaca”, “nega do caralho”. Além disso, Maria Sidronia costumava filmá-la ironicamente, chamando-a de “Xuxa dando um show”.

Em um dos episódios de violência, a patroa jogou uma cadeira na vítima, que também foi trancada na lavanderia e espancada quando pediu para sair. Embora não fosse impedida de sair de casa, não o fazia por medo e por não conhecer ninguém.

A vítima também relatou que trabalhou mesmo com uma lesão grave na perna, que poderia ser uma úlcera. Além disso, em 2017, foi ameaçada de expulsão caso denunciasse a situação.

Prisão emocional e resgate

Um auditor fiscal do Trabalho que acompanhou a vistoria judicial em 2022 afirmou que a vítima estava em “prisão emocional”. Segundo ele, “ela tinha a chave da corrente, mas não sabia como usar“.

A mulher foi resgatada em julho de 2022 e encaminhada a um abrigo. Desde então, recebe apoio das autoridades e passa por um processo de reabilitação.