Mesmo que você não seja um cristão devoto, certamente já ouviu falar da quaresma e do costume de não comer carne durante esse período. No entanto, você sabe qual é a origem desse intervalo de penitência, o que ele representa e por que algumas pessoas deixam de ser “carnívoras” nesta época do ano?
Como o próprio nome quaresma sugere, trata-se de um período de quarenta dias que começa na quarta-feira de cinzas e termina na Páscoa, descontando os domingos. Esse intervalo serve para que os cristãos se preparem para celebrar a ressurreição de Cristo, e é marcado por penitências que, além da famosa abstenção à carne, incluem sacrifícios como o jejum, a prática da caridade, as mortificações — punições físicas ou mentais por amor a Deus — e muitas orações.
Origem
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Desconsiderando as prováveis origens pagãs do costume, existem registros históricos que se referem à prática de penitências como forma de preparação para a Páscoa desde os primórdios do cristianismo. Contudo, os períodos de tempo variavam entre horas ou dias, passando por semanas inteiras e até mesmo intervalos maiores, e cada crente seguia o ritual que achasse melhor. Uma bagunça!
Foi só no século 4 que o período de 40 dias foi estabelecido, e a duração está baseada em várias referências bíblicas relacionadas com o número. Entre as mais significativas, está o intervalo de tempo em que Jesus permaneceu no deserto, a duração do dilúvio que inundou a Terra — lembra-se de Noé? —, quantos dias demorou a jornada dos israelitas que partiram do Egito com destino à Terra Prometida, o período que Moisés passou no Monte Sinai etc.
Fominha
Tentação de Cristo Fonte da imagem: Reprodução/Wikipédia
Hoje em dia, o mais comum é que os cristãos mais devotos façam alguns jejuns, promessas e deixem de comer carne durante a quaresma. Mas no passado as coisas eram bem diferentes e restritivas. No século 5, por exemplo, existiam os que riscavam completamente do cardápio a carne de qualquer animal, enquanto outros abriam exceções para os peixes e, em alguns casos, para as aves também.
Além disso, havia quem evitasse frutos com cascas duras e ovos, enquanto os devotos mais fervorosos contemplavam o sacrifício de fazer jejum durante 24 horas inteiras ou mais durante a Semana Santa, e até os que restringiam as refeições a apenas uma ou duas por semana nesse período.
Entretanto, a “regra” mesmo era a de que as pessoas fizessem apenas uma refeição ao dia — pela noite — e evitassem totalmente a carne e o vinho; o consumo de laticínios só era permitido em troca da prática de caridades. Atualmente, além da Igreja Católica, a Anglicana, a Ortodoxa, a Luterana e determinadas evangélicas seguem a tradição, e as penitências se tornaram muito mais brandas do que as de antigamente.
Quaresma modernizada
Sacrifício de Noé Fonte da imagem: Reprodução/Wikipédia
Com o passar dos séculos, algumas modificações foram sendo permitidas e respeitar a quaresma ficou um pouco mais fácil. O período de penitências ainda começa na quarta-feira de cinzas e transcorre durante 40 dias excluindo os domingos, e os mais devotos se limitam a fazer apenas uma refeição por dia — e sem carne no cardápio — na quarta-feira de cinzas e na Sexta-feira Santa.
A carne também fica proibida nas demais sextas-feiras da quaresma, e os fiéis são encorajados a fazer algum sacrifício — como abrir mão de consumir chocolate ou bebidas alcoólicas, por exemplo — durante esse período. Contudo, “tecnicamente”, o tal sacrifício fica suspenso no dia de São José (19 de março) e no Dia da Anunciação (25 de março), quando os penitentes estão liberados para esquecer suas promessas.
E os domingos?
Criação de Adão Fonte da imagem: Reprodução/Wikipédia
Como você sabe, os discípulos de Jesus eram judeus e, sendo assim, guardavam o sábado — ou Sabbath — como dia de descanso e adoração. Isso porque, segundo o Gênesis, após criar o mundo, Deus descansou no sétimo dia, designando o sábado como dia de repouso.
Entretanto, como Cristo ressuscitou em um domingo, os cristãos transferiram o dia de descanso, e todos os domingos passaram a ser considerados dias para celebrar a sua ressurreição. Portanto, assim como acontece com os judeus e o Sabbath, os cristãos ficaram proibidos de jejuar ou fazer penitências aos domingos e, por essa razão, esses dias da semana ficam fora do “calendário” da quaresma.
Mais curiosidades
Fonte da imagem: Reprodução/Wikipédia
- O termo “quaresma” tem sua origem na expressão latina quadragesima dies, que significa quadragésimo dia;
- Oficialmente, o jejum como forma de sacrifício na quarta-feira de cinzas e na Sexta-feira Santa deve ser realizado por cristãos batizados;
- A cor litúrgica associada com a quaresma é a roxa, que simboliza o luto, a penitência e o sacrifício. No quarto domingo do período — o da “Alegria” — se usa a cor rosa e, no Domingo de Ramos, o tom adotado é o vermelho, para simbolizar a Paixão de Cristo;
- A cruz cinza que é aplicada na testa dos fiéis no início da quaresma recria um antigo ritual proveniente do Oriente Médio no qual cinzas eram jogadas sobre a cabeça para simbolizar o arrependimento perante Deus.
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E você, leitor, costuma seguir o costume de jejuar e de não comer carne durante a quaresma? E com relação às promessas, você já fez alguma bem difícil de cumprir ou conhece alguém que decidiu abrir mão de algo absurdo durante esse período? Não deixe de compartilhar conosco nos comentários.