Entidades criticam Bolsonaro por acusar ministro Alexandre de Moraes de tomar decisão ‘política’

Ministro do STF suspendeu nomeação de Alexandre Ramagem, amigo da família Bolsonaro, para direção-geral da PF, após denúncias de que presidente quer interferir na corporação.

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Entidades ligadas à magistratura e à advocacia criticaram nesta quinta-feira (30) o presidente Jair Bolsonaro, que mais cedo acusou o ministro do STF Alexandre de Moraes de tomar uma decisão “política” ao suspender a nomeação de Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal.

Os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes também se manifestaram, com apoio a Moraes e críticas a Bolsonaro.

Em sua decisão, Moraes apontou indícios de desvio de finalidade na nomeação de Ramagem. O ministro do Supremo levou em consideração denúncias feitas pelo ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, que pediu demissão na semana passada sob a alegação de que Bolsonaro tentava interferir politicamente na PF.

A interferência, de acordo Moro, Bolsonaro viria justamente com a nomeação para o comando da PF de Alexandre Ramagem, que é amigo pessoal dos filhos do presidente, no lugar de Maurício Valeixo, indicado pelo ex-ministro.

Moraes destacou na decisão as afirmações de Moro de que Bolsonaro queria “ter uma pessoa do contato pessoal dele” no comando da PF, “que pudesse ligar, colher informações, colher relatórios de inteligência”.

O ministro do STF afirmou também na decisão que o próprio Bolsonaro confirmou que gostaria de receber informações da PF, no pronunciamento que o presidente fez horas após a demissão de Moro.

Na quarta, após a determinação de Moraes, Bolsonaro publicou decreto que tornou sem efeito a nomeação de Ramagem para a PF e o recolocou na direção-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Já na manhã desta quinta, ao deixar o Palácio da Alvorada, o presidente disse a jornalistas que a decisão do ministro Alexandre de Moraes foi “política” e uma “canetada”. Ele ainda rebateu a rejeição a Ramagem pelo fato de ele ser amigo de seus filhos alegando que a nomeação de Moraes pelo ex-presidente Michel Temer para o Supremo também foi por amizade.

“Se não pode estar na PF, não pode estar na Abin também. No meu entender, uma decisão política, política. E ontem [quarta] comecei o pronunciamento falando da Constituição. Eu respeito a Constituição e tudo tem um limite”, afirmou o presidente. “Não justifica a questão da impessoalidade. Como é que o senhor Alexandre de Moraes foi para o Supremo? Amizade com o senhor Michel Temer. Ou não foi?”, completou.

Alexandre de Moraes foi ministro da Justiça de Temer, entre outros cargos que desempenhou na vida pública, como secretário de segurança de Geraldo Alckimin, do PSDB, além de ser constitucionalista de renome, com vários livros publicados.

Bolsonaro disse ainda não ter “engolido” a determinação de Moraes porque, segundo ele, “essa não é a forma de tratar” um presidente. Bolsonaro disse ainda que vai recorrer da decisão.

“Eu não engoli ainda essa decisão do senhor Alexandre de Moraes. Não engoli. Não é essa a forma de tratar um chefe do Executivo que não tem uma acusação de corrupção, que faz todo o possível pelo o seu país, sacrifica sua família, sacrifica seus amigos, sacrifica a todos”, reclamou Bolsonaro.

Repercussão

Veja a repercussão das declarações de Bolsonaro sobre a decisão de Alexandre de Moraes:

Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) – “As decisões judiciais podem ser criticadas e são suscetíveis de recurso, enquanto mecanismo de controle. O que não se aceita – e se revela ilegítima – é a censura personalista aos membros do Judiciário. Ao lado da independência, a Constituição consagra a harmonia entre poderes.”

Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) – “O ministro Alexandre de Moraes chegou ao Supremo Tribunal Federal após sólida carreira acadêmica e de haver ocupado cargos públicos relevantes, sempre com competência e integridade. No Supremo, sua atuação tem se marcado pelo conhecimento técnico e pela independência. Sentimo-nos honrados em tê-lo aqui”.

Fernando Mendes, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) – “É importante ficar claro que o Poder Judiciário é um dos poderes da República, e é inadmissível que uma autoridade pública não reconheça esse princípio basilar ou queira se sobrepor a essa realidade constitucional. A própria Constituição prevê o direito à livre manifestação, mas, por outro lado, não permite desferir ofensas gratuitas, agressões verbais, tampouco atentar contra as instituições. É inadmissível que qualquer Magistrado, no exercício das suas funções constitucionais de decidir com base em seu livre convencimento motivado, seja alvo de ataques pessoais. Atitudes assim, somente demonstram a importância de se ter um Judiciário cada vez mais forte e independente e que exerça sua função de colocar limites constitucionais à atuação de qualquer um dos poderes e de seus dirigentes, no âmbito do Estado Democrático de Direito.”

Felipe Santa Cruz, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – “O excelentíssimo senhor presidente da República, que já não é conhecido por sinais de apreço à democracia, às instituições, dá um passo a mais. Ou seja, nós todos sabemos que cabe ao STF a salvaguarda da Constituição, e cabe a nós, brasileiros, acatar as decisões do Supremo, interpor quando for o caso da nossa insatisfação, os recursos cabíveis, e respeitar as decisões proferidas pelo poder judiciário. O presidente dá péssimo exemplo ao criticar politicamente um ministro, dizer que motivações políticas estariam por trás de uma decisão, o que claramente é algo que o presidente não tem provas para fazê-lo. E sem dúvida dá mais um mal exemplo ao povo brasileiro, de formas de reação no meio dessa pandemia.”

Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) – “A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) alerta sobre a necessidade de respeito à independência e à autonomia dos juízes, desembargadores e ministros para desempenharem suas funções constitucionais. No Estado de Direito, decisões judiciais devem ser cumpridas. Eventuais contestações devem ocorrer por meio dos recursos cabíveis e assegurados a todos os cidadãos. A AMB, maior entidade da magistratura nacional, com 14 mil associados –incluindo juízes estaduais, militares e do trabalho, além de ministros dos tribunais superiores–, estará sempre vigilante e pronta para atuar, com todos os meios legais disponíveis, em defesa da Constituição e das prerrogativas da magistratura.”

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