Essa é a primeira vez que grupos como entidades sindicais e movimentos sociais convocam manifestações de rua contra o presidente durante a pandemia. Em janeiro, houve carreatas de grupos de direita e de esquerda pelo impeachment de Bolsonaro.
Atualmente, grupos de esquerda, com reivindicações diversas, ainda se dividem sobre os riscos de os atos acabarem agravando o espalhamento da covid-19 num momento que a doença voltou a avançar no país ou enfraquecendo as críticas às aglomerações promovidas por Bolsonaro.
Grande parte do material de convocação dos atos recomenda o uso de máscara PFF2 (ou N95), além de álcool em gel e distanciamento físico.
A pauta dos atos inclui diversas demandas, como o impeachment de Bolsonaro, a volta do auxílio emergencial de R$ 600, a ampliação das vacinas disponíveis, o fim da violência contra a população negra e a suspensão de cortes de verbas na Educação, das privatizações e da reforma administrativa.
As manifestações previstas em pelo menos 24 Estados e no Distrito Federal ocorrem no momento de maior fragilidade política de Bolsonaro, amplamente criticado por sua condução da pandemia e pela deterioração da economia brasileira.
Segundo a mais recente pesquisa do instituto Datafolha, de 11 e 12 de maio, a aprovação do presidente atingiu o patamar mais baixo de seu mandato.
Ao todo, 24% da população considera o governo ótimo ou bom, uma queda de seis pontos percentuais em relação a março.
Além disso, Bolsonaro aparece atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas intenções de voto para a eleição presidencial em 2022. O petista tem 41% no primeiro turno, e Bolsonaro, com 23%, segundo o Datafolha.
Lugares com protestos previstos
A BBC News Brasil identificou protestos marcados, com diferentes pautas, em ao menos 85 cidades de 24 Estados e no DF. São elas:
AL: Maceió
AM: Manaus, Tefé, Presidente Figueiredo, Itacoatiara e Humaitá
AP: Macapá
BA: Ilhéus e Salvador
CE: Fortaleza e Juazeiro do Norte
DF: Brasília
ES: Vitória
GO: Goiânia e Catalão
MA: Caxias, São Luís e Imperatriz
MG: Belo Horizonte, Barbacena, Caratinga, Divinópolis, Governador Valadares, Itabirito, Juiz de Fora, Mariana, Montes Claros, Ouro Branco, Ouro Preto, Pouso Alegre, São João Del Rei, Uberaba, Uberlândia e Viçosa
MS: Dourados, Aquidauana, Campo Grande e Três Lagoas
MT: Cuiabá e Rondonópolis
PA: Belém, Abaetetuba, Altamira, Castanhal e Santarém
PB: João Pessoa, Campina Grande e Patos
PE: Recife, Caruaru e Garanhuns
PI: Teresina
PR: Curitiba, Foz do Iguaçu, Cascavel, Ponta Grossa e Maringá
RJ: Rio de Janeiro e Campos dos Goytacazes
RN: Mossoró e Natal
RO: Porto Velho
RS: Caxias do Sul, Passo Fundo, Porto Alegre, Bagé e Pelotas
SC: Florianópolis, Blumenau e Joinville
SE: Aracaju
SP: São Paulo, Ribeirão Preto, São Bernardo do Campo, São José dos Campos, Assis, Campinas, Indaiatuba, Jacareí, Praia Grande, Santos, Taubaté e Ubatuba
TO: Araguaína e Palmas
Reivindicações dos protestos
Há diversas demandas citadas nas convocações para os atos contra o presidente.
Para a CSP-Conlutas, Bolsonaro “é o principal responsável pela extensão e agravamento da pandemia e pela explosão do desemprego e da fome. São inúmeros os seus crimes e a sua prática e discurso tem sido impulsionadora de atrocidades como a chacina do Jacarezinho”.
Entidades estudantis como a UNE falam em ir para a rua contra cortes orçamentários para a educação e “a iminência de fechamento de universidades e institutos federais que estão sem verbas”.
Entenda abaixo algumas das demandas dos grupos que convocam os protestos para 29/5 além do impeachment de Bolsonaro.
– Auxílio emergencial e vacinas
Duas das principais reivindicações dos organizadores são a ampliação da oferta de vacinas contra covid-19 e o aumento do valor do auxílio emergencial.
Desde fevereiro, o país leva de 12 a 14 dias para aplicar 10 milhões de vacinas. Quase 42 milhões de brasileiros receberam a primeira dose e 21 milhões, as duas (cerca de 10% da população). Só que uma em cada cinco cidades têm enfrentado falta de vacinas, segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM).
Por outro lado, a versão reduzida do auxílio emergencial aprovada para 2021 excluiu quase 20 milhões de brasileiros em situação vulnerável do benefício. Além disso, o auxílio caiu de R$ 600 para R$ 200 neste ano, e manifestantes cobram que o valor volte a ser de R$ 600.
O Brasil encerrou o primeiro trimestre com 14,2% de desempregados, a maior taxa já registrada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na série histórica, iniciada em 2002. São 14,3 milhões de pessoas sem trabalho.
– Verbas para educação
O orçamento das universidade federais está em queda desde 2013, ainda no governo Dilma Rousseff (PT), mas a situação se agravou mais durante os governos Michel Temer (MDB) e Bolsonaro. O aumento das verbas para educação está na pauta de grande parte dos protestos.
No início de maio deste ano, a reitora e o vice-reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a maior do país, afirmaram em artigo no jornal O Globo que a instituição poderia fechar as portas no segundo semestre por falta de verbas.
“O orçamento discricionário aprovado pela Lei Orçamentária para a UFRJ em 2021 é 38% daquele empenhado em 2012. Quando se soma o bloqueio de 18,4% do orçamento aprovado, como anunciado pelo governo, seu funcionamento ficará inviabilizado a partir de julho. A UFRJ fechará suas portas por incapacidade de pagamento de contas de segurança, limpeza, eletricidade e água.”
Entidades estudantis também criticam os cortes orçamentários de bolsas de pesquisas no ensino superior, o que deixa “residentes, mestrandos e doutorandos sem possibilidade de dar continuidade aos seus trabalhos”, segundo a Associação Nacional de Pós-Graduandos.
– Reforma administrativa e privatizações
Parte do material de convocação aos atos faz críticas à proposta de reforma administrativa do governo Bolsonaro.
O texto atual da PEC 32, em tramitação na Câmara dos Deputados, restringe a estabilidade dos funcionários públicos, por exemplo, mas só serão afetadas novas contratações feitas pela máquina pública, sem mexer com salários, carreiras e benefícios de servidores atuais.
A proposta passou pela Comissão de Constituição e Justiça e será apreciada em seguida por uma comissão especial na Casa.
Outro pilar do programa econômico do governo federal proposto ainda na eleição de 2018 é a privatização de estatais. Essa pauta perdeu força ao longo do mandato de Bolsonaro, o que levou à saída de Salim Mattar, secretário especial de desestatização.
Em balanço divulgado por Mattar em agosto de 2020, operações de “desestatização e desinvestimento” no governo Bolsonaro geraram, por enquanto, R$ 134,9 bilhões. Um valor bem aquém do R$ 1 trilhão em ativos a serem privatizados, segundo Paulo Guedes, ministro da Economia.
Numa tentativa de reverter a imagem de que a agenda de privatizações do governo está parada, Bolsonaro entregou no fim de fevereiro uma medida provisória que busca acelerar a privatização da Eletrobras. O texto foi aprovado pela Câmara em 19 de maio e precisa ser aprovado pelo Senado até 22 de junho para não perder sua validade.